Além de provocar mais de 1,2 milhão de mortes em todo o mundo, a pandemia de Covid-19 deixou claro que seus impactos são mais intensos nas famílias vulneráveis e seus efeitos, sentidos de forma diferente entre homens e mulheres. Enquanto o isolamento social significou desemprego ou diminuição drástica na renda de grande parte da população, para muitas mulheres, suas próprias casas se tornaram sinônimo de medo e insegurança. O aumento no número de casos de violência doméstica levou a Organização das Nações Unidas a publicar recomendações específicas para enfrentar essa situação em todo o mundo.
No Brasil, durante a pandemia, a condição de desigualdade entre mulheres e homens chama atenção. Elas representam 70% da força de trabalho em serviços sociais e de saúde, o que significa que estão na linha de frente de combate à doença. Observa-se ainda, que as mulheres foram as mais afetadas pelo desemprego, pelo fechamento de serviços públicos, sobretudo escolas e creches, e pelo aumento da informalidade, porta de entrada das mulheres no mercado profissional autônomo. Não por acaso, o trabalho doméstico encontra-se na centralidade das discussões sobre vulnerabilidade social, econômica e segurança sanitária das mulheres.
Se precisam continuar a trabalhar, como protegê-las do contágio? Se não trabalham, como garantir remuneração ou condições para que consigam fazer novas escolhas após situações de violência?
Esse cenário motivou o nascimento do projeto Mulher Empreendedora, uma parceria entre a Prefeitura de Niterói, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e a Aliança Empreendedora. “Queremos que esse trabalho se desenvolva em grande escala depois da pandemia, para que essas mulheres tenham maior independência financeira, autoestima e atuem em rede de solidariedade”, defende a secretária de planejamento de Niterói, Ellen Benedetti.
Para o projeto, a Prefeitura de Niteroi mobilizou suas equipes: por um lado, a unidade de gestão do Programa de Desenvolvimento Urbano e Inclusão Social de Niterói (PRODUIS), programa de parceria entre a Prefeitura e o BID desde 2014 que visa promover, através de um projeto urbano-social, a melhoria da qualidade de vida dos moradores das comunidades denominadas Capim Melado, Vila Ipiranga, Igrejinha do Caramujo e São José. O PRODUIS se estrutura na urbanização dessas comunidades, bem como na inclusão social de seus moradores. As intervenções se constituem em implementação de infraestrutura básica, promoção de serviços sociais, promoção de atividades de educação sanitária e ambiental, regularização fundiária, e reassentamento de famílias.
Por outro lado, também foi mobilizada a CODIM – Coordenadoria de Políticas e Direitos para as Mulheres, cujo objetivo é formular, desenvolver e avaliar programas e projetos voltados à promoção e defesa dos direitos das mulheres. Vinculado à sua estrutura encontra-se o CEAM, Centro Especializado de Atendimento à Mulher, serviço que realiza o acolhimento, acompanhamento e encaminhamento interdisciplinar às mulheres em situação de violência, sobretudo doméstica.
Para o BID, o projeto foi mais uma oportunidade de promover inclusão de gênero, considerando a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho e geração de renda para as mulheres. O projeto foi financiado dentro de uma iniciativa mais global da divisão de Desenvolvimento Urbano do BID de promoção do bem-estar de mulheres e mães trabalhadoras, que apoia diversas iniciativas na América Latina e no Caribe. Também se integra nos objetivos de combate às desigualdades de gênero nas cidades e promoção da produtividade urbana através da igualdade de gênero.
Para implementar capacitações remotas a mulheres empreendedoras nestes territórios de Niterói, sejam elas iniciantes ou já na frente de um negócio, a Prefeitura e o BID fecharam uma parceria com a Aliança Empreendedora, organização social especializada em apoiar empresas, organizações sociais e governos a desenvolver modelos de negócios inclusivos e projetos de apoio a microempreendedores de comunidades e periferias, ampliando o acesso a conhecimento, redes, mercados e crédito para que desenvolvam ou iniciem seus empreendimentos, em todo o Brasil.
Mulheres “chefes de família”
“Empreendedora e futura empresária, com orgulho!” É pela potência dessas palavras que Cíntia Reis, 47 anos, descreve como passou a se enxergar, depois de participar do projeto Mulher Empreendedora. Moradora do bairro Engenhoca, em Niterói, ela não é a única que quis assumir o “comando” de sua vida e transformar aquilo que era apenas uma renda extra, em sustento da família.
Não é de hoje que o número de mulheres responsáveis financeiramente pelos lares vem crescendo, passando de 14 milhões, em 2001, para 28,9 milhões, em 2015, de acordo com a pesquisa da Escola Nacional de Seguros, Mulheres Chefes de Família no Brasil: avanços e desafios, realizada, em 2018, por José Eustáquio Diniz Alves e Suzana Cavenaghi. Diante disso, o empreendedorismo parece ser uma chave para que elas assumam suas próprias histórias, seja por não contarem com ajuda de um companheiro ou para que possam garantir autonomia e superar situações de violência. O GEM (Global Entrepreneurship Monitor), principal pesquisa sobre empreendedorismo no mundo, mostrou em sua última edição (2019) que 25,8 milhões de mulheres estão à frente de negócios no Brasil, o que representa 47,3% do total de negócios iniciais ou estabelecidos no país.
Capacitação e empoderamento
Se engana quem pensa que começar um negócio próprio se resume a colocar as ideias no papel e aprender a fazer planilhas. Esta vertente de capacitação tem foco em temas relacionados à gestão, mas também empoderamento feminino e autoconhecimento: para as iniciantes, uma injeção de incentivo; para as mulheres já atuantes, um suporte para a formalização, aumento de vendas e formação de rede. Cíntia, por exemplo, confessa que o seu maior aprendizado foi confiar em si mesma e resgatar a coragem de sonhar. “Perdi o medo e me imagino expandindo, fornecendo meu produto para vários lugares. Sei que posso ter uma vida melhor para mim e meus filhos”, diz.
Apesar dos desafios de uma formação online, os conteúdos e o formato da capacitação foram gratuitos e adaptados à rotina diária das participantes. Afinal, o projeto não poderia ser mais uma sobrecarga para as mulheres, muitas delas, mães. Então, toda a comunicação aconteceu por meio do WhatsApp e YouTube, ferramentas de fácil acesso, acionadas através dos celulares de cada uma. Créditos de celular foram carregados para as participantes, para garantir que ninguém ficasse de fora por razoes de exclusão digital.
A história de Cíntia e o retorno das outras 184 mulheres que participaram das três turmas do curso fazem a coordenadora de projetos da Aliança Empreendedora, Regina Pfiffner, acreditar no sucesso do curso Mulher Empreendedora. Ela conta como foi impressionante a forma de mobilização das participantes e a construção de redes de parceria para apoiarem umas às outras. “Percebemos na interação o quanto a capacitação contribuiu na melhoria de vida e no despertar de um olhar empreendedor”.
Gabriela diz
Parabens pelo otimo post, gostei bastante do conteudo!!!
felipe dias diz
gostei muito do seu site e do conteúdo. vou acompanhar toda semana as atualizações