“O melhor lugar do mundo é a casa da mãe da gente”: o samba interpretado pela ludovicense Alcione destaca uma verdade incontestável. Mais do que um prédio, casa é espaço de acolhimento, de pertencimento. Neste Dia Mundial das Cidades, contamos a bem-sucedida experiência de São Luís, que mostra que a casa pode ser também palco de ações de preservação de patrimônio.
Desenvolvido pela Prefeitura Municipal de São Luís em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Programa de Revitalização do Centro Histórico de São Luís – Procidades demonstrou que não é preciso estabelecer um dilema entre respeitar a memória histórica ou enfrentar o desafio da habitação para famílias de baixa renda. Na verdade, de maneira planejada e estruturada, é possível avançar nas duas frentes ao mesmo tempo.
O caso da capital maranhense, aliás, oferece inspiração para diversas outras cidades brasileiras que também convivem com centros históricos esvaziados, com imóveis abandonados e ocupações irregulares, ao mesmo tempo em que centenas de pessoas buscam um lugar para morar.
Um Centro – e um passo – histórico
Com áreas de tombamento federal e estadual e inscritas na Unesco como Patrimônio Mundial, o Centro Histórico de São Luís possui mais de 5 mil imóveis, muitos deles testemunhas históricas da colonização. E mais: como acontece com muitos centros de cidades, está próximo de infraestrutura de transporte, emprego e serviços públicos, mas distante das zonas de maior densidade residencial.
E é neste cenário que o Procidades, em busca de soluções para uma demanda habitacional reprimida, encontrou uma saída na reabilitação de imóveis e na reocupação dos espaços públicos pela população. Neste ano, foram entregues 22 unidades habitacionais para população de baixa renda, divididas em duas edificações.
A reabilitação dos edifícios da Rua da Palma Nº 195/205 e Rua do Giz Nº 445, com 14 e 08 apartamentos respectivamente, é um exemplo de arranjo institucional para atender a uma demanda urgente da população e serve como piloto para a municipalidade, que pela primeira vez realizou uma entrega habitacional no centro histórico de São Luís.
Passo a passo até a reocupação
O caminho até a recuperação e reocupação de imóveis começou com a desapropriação de edificações abandonadas.
Ato contínuo, a Secretaria Municipal de Urbanismo e Habitação cadastrou 420 pessoas interessadas e confirmou 259 para as futuras novas moradias. Para concorrer às unidades habitacionais, era preciso que as famílias estivessem em situação de vulnerabilidade social e fossem moradoras do centro histórico. A comprovação se deu por meio de uma consultoria social contratada pelo programa, que realizou visitas domiciliares, juntamente ao trabalho colaborativo das gestões municipal e federal, concessionárias de energia, água e esgoto, Defensoria Pública do Estado e a comunidade, por meio da União de Moradores do Centro Histórico.
Com um projeto contratado pela Fundação Municipal de Patrimônio Histórico-FUMPH e execução através de convênio federal entre o município e o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, as obras desses imóveis duraram pouco mais de dez anos. Entre as dificuldades, estiveram tempos de aprovações das intervenções pelos órgãos de preservação, achados arqueológicos que exigiram alterações de abordagem e impactaram o cronograma e mudanças de gestão. Por fim, em abril de 2022, os moradores selecionados tomaram posse de suas novas casas e firmaram o instrumento legal da cessão de uso, que garante permanência no imóvel por 30 anos, renováveis.
Transparência e participação
Por meio da União de Moradores do Centro Histórico, as famílias cadastradas acompanharam passos como sorteio eletrônico para as moradias e a execução das obras. Algumas unidades foram reservadas para públicos específicos: idosos, mulheres chefes de família e pessoas com deficiência (10% cada).
Como parte da estratégia do Programa, um Trabalho Técnico Social está sendo realizado durante sete meses a partir da mudança das famílias, fundamentado em cinco eixos:
- mobilização;
- organização e fortalecimento social;
- acompanhamento e gestão social da intervenção;
- educação ambiental e patrimonial;
- desenvolvimento econômico e apoio a gestão condominial.
As despesas com manutenção do apartamento e do condomínio, aliás, estão a cargo dos contemplados, que contam com apoio da Smart Síndico, que desenvolveu um aplicativo para gestão condominial de habitação de interesse social. A parceria oferece serviços de apoio ao síndico e moradores, como relatórios de prestação de contas, comunicação interna, controle de despesas e receitas e outros. É interessante notar que a Prefeitura de São Luis tomou conhecimento deste aplicativo em um evento de Inovação Aberta organizado pelo BID em 2019 para conectar mutuários e startups atuantes em temas habitacionais e urbanos.
A transformação desses casarões em prédios habitacionais com apartamentos que possam acomodar famílias de acordo com suas necessidades foi um passo importante, mas não o único do projeto. Agora, seguem-se as ações de fortalecimento econômico e garantias para a permanência desses moradores na área central da cidade.
Junto com intervenções de reabilitação de espaços públicos, prédios institucionais, culturais e universitários, e atendimento a comerciantes de rua do Centro Histórico, essas ações fazem parte de uma estratégia cujo objetivo é apoiar, organizar e manter a população residente, bem como, preservar e atrair novos residentes e atividades comerciais, tornando o Centro mais atrativo e seguro para moradia, lazer e visitação de turistas interessados em seu acervo histórico e cultural.
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