O Brasil e os países da região têm um dilema difícil para resolver. O aumento da renda nacional está alimentando as demandas por mais e melhores serviços públicos. Ao mesmo tempo, os governos que aumentaram seus gastos durante os anos do boom das commodities, agora enfrentam condições externas menos favoráveis e precisam se ajustar. Em um contexto de fatores externos adversos, há pressões para a busca de fontes internas de crescimento. O que pode ser feito para que as contas fechem?
Nosso novo relatório – Melhores Gastos para Melhores Vidas – sustenta que o essencial é fazer mais com menos e realocar os gastos sem hipotecar o futuro. Nada indica que o Brasil não possa dar esse salto. No entanto, o governo terá que implementar reformas necessárias que assegurem um gasto mais inteligente e mais eficiente e, ao mesmo tempo, explicar aos cidadãos as medidas adotadas. Uma maior eficiência traria inúmeros benefícios. Poderia criar um círculo virtuoso, que convença os cidadãos de que podem confiar no seu governo para investir seus impostos adequadamente no longo prazo, em vez de desperdiçá-los em gastos indevidos e corrupção.
É preciso aumentar a despesa de capital
Um dos maiores perdedores em termos de gasto público tem sido a despesa de capital, ingrediente fundamental para o crescimento. O principal responsável por grande parte do aumento do gasto público durante os anos do boom das commodities foi a despesa corrente e não a despesa de capital. Além disso, em tempos de consolidação fiscal, o peso do ajuste recairia sobre os cortes da despesa de capital, embora seu impacto no produto – seu efeito multiplicador – seja muito maior do que o da despesa corrente. O investimento privado, outro grande propulsor do crescimento, também é afetado, visto que os investidores privados relutam em colocar seu dinheiro em locais com baixa despesa de capital, onde poderiam encontrar estradas e portos de qualidade inferior.
Investir na infância e no futuro
Outra forma de não comprometer o futuro é investir nas crianças, que são o pilar da acumulação de capital humano e do crescimento. No entanto, quando analisamos quanto o Brasil gasta com as crianças em relação à terceira idade, alguns números chamam a atenção: em média, o Brasil gasta US$7 mil com cada aposentado, mas apenas US$ 1 mil com cada criança. Essa situação exige melhor equilíbrio em termos dos gastos da região no presente em relação ao futuro.
Caso sejam necessários ajustes, há várias fontes de ineficiência que podem ser consideradas para gerar economias substanciais. É aqui que o “fazer mais com menos” entra em ação. Se tomarmos três componentes-chave do gasto público, a saber, gasto com salários, transferências e compras públicas, observa-se no relatório que, em média, o Brasil poderia economizar até 3,9% do PIB se esses gastos fossem feitos de maneira eficiente. As diferenças salariais entre os setores público e privado, especialmente no caso de trabalhadores pouco qualificados, chegam em média a cerca de 23%, ou seja, o salário de um trabalhador do setor público é 23% superior ao da sua contraparte no setor privado. Além disso, várias transferências, incluindo transferências de renda e proteção social não contributiva – que, em princípio, deveriam beneficiar os mais desfavorecidos – acabam nas mãos dos não pobres. Essas infiltrações deveriam ser evitadas. No entanto, outra questão é a das compras governamentais: até 17% delas poderiam ser o resultado de preços inadequados ou de corrupção.
Com esse desempenho, não é de surpreender que os cidadãos tenham pouca confiança nos governos. No entanto, nosso relatório vai além e analisa o tipo de gasto que os cidadãos exigem quando a confiança no governo é baixa. A principal conclusão é que, nesses casos, os cidadãos privilegiam as transferências em detrimento de gastos de longo prazo mais lucrativos, como, por exemplo, investimentos em educação ou infraestrutura, que podem ou não se materializar. Aqui, cabe o velho provérbio: “mais vale um pássaro na mão do que dois voando”.
A importância das instituições democráticas nesse esforço é crucial. A maioria das pessoas na região vive em democracias bem consolidadas. No entanto, as instituições legislativas tendem a ser fracas e oferecem pouco incentivo para que os membros do Congresso construam uma carreira. Essa situação leva à incapacidade para pensar no longo prazo e estabelecer negociações intertemporais, que podem ser fundamentais para apoiar gastos no longo prazo. Assim, do lado tanto da demanda quanto da oferta, as transferências ganham o acúmulo de capital humano e físico, ou – em outras palavras – o presente supera o futuro.
Maior eficiência para romper o círculo vicioso
Aumentar a eficiência do gasto é a única forma de romper esse círculo vicioso. Os governos precisam ser capazes de fazer mais com menos ou com a mesma quantidade de recursos. Devem mostrar que podem produzir melhores serviços e, no processo, angariar a confiança das pessoas no que se refere à sua capacidade de fazer investimentos de longo prazo que contribuirão para melhorar o bem-estar dos cidadãos. Isso exigirá mudanças, que vão de novas regras fiscais para proteger o investimento de capital a transformações nas instituições políticas que coloquem o progresso de longo prazo acima dos interesses de curto prazo. Também pode levar à criação de mecanismos que permitam aos cidadãos monitorar mais adequadamente o gasto público. Consequentemente, não há alternativas. Se o Brasil e os países da região desejam reverter sua queda de produtividade e alcançar os níveis de vida de países mais desenvolvidos, precisam fazer mais com menos, aumentar a despesa de capital e voltar o seu olhar para o futuro.
Excelente post! Muito adequado para a realidade brasileira. Recentemente tomei conhecimento pela imprensa de um estudo que afirma que cerca de 30% da água limpa e tratada, ideal para o consumo humano, é desperdiçada ou roubada e não chega às torneiras dos brasileiro. Exemplos como esse deixam claro que uma gestão mais profissional e mais eficiente dos recursos públicos é um passo decisivo para um Brasil mais forte e próspero.