Evidências iniciais de que a COVID-19 está alcançando as comunidades afrodescendentes na América Latina têm crescido. Estatísticas do Brasil mostram que a população negra tem maior probabilidade de desenvolver sintomas respiratórios letais (mais de 20%). A costa pacífica colombiana, que tem uma grande população afro–colombiana e indígena, registrou os primeiros casos de coronavírus semanas atrás e todas as províncias do Panamá também registraram casos.
A população negra frequentemente executa o trabalho essencial na linha de frente, fazendo a limpeza, transporte, entrega, estocagem e fornecendo os serviços de saúde que necessitamos. Por exemplo, afro–uruguaios representam 8% da população, mas uma em cada quatro mulheres negras são trabalhadoras domésticas no país. De acordo com dados sobre imigrantes, 50% dos afro–panamenhos que vivem nos Estados Unidos são enfermeiros, e enfermagem é uma das profissões mais populares entre as mulheres negras do país.
O que acontece quando combinamos a representação elevada de afrodescendentes nos postos de trabalho classificados como essenciais e a desigualdade histórica no seu acesso à saúde?
Desafios e Opções para Políticas Públicas
Os negros têm menores chances de ter acesso a crédito e também possuem menor renda e menor taxa de poupança. Como resultado, podem vir a ter menos capacidade de se abastecer de alimentos e itens domésticos em períodos de crise. Eles têm também uma probabilidade bem maior de serem trabalhadores informais ou autônomos.
As condições enfrentadas pela população afrodescendente no Brasil e na região são desafiadoras, contudo, elas não são novas e há diversas políticas que governos podem conduzir para reforçar a resiliência histórica dessas comunidades na região.
- Priorizar a coleta de estatísticas de atendimento médico desagregada por raça/cor e grupo étnico e relatar as suas taxas de mortalidade.* A confidencialidade dessas informações deve ser preservada para garantir um atendimento de qualidade e sem discriminação.
- Aumentar a realização de testes preventivos, com foco na população negra de alto risco, especialmente em áreas com alta concentração de idosos e trabalhadores essenciais.
- Fornecer estações de higienização das mãos em áreas onde não há acesso à água para lavar mãos e onde há muitos trabalhadores em atividades essenciais.
- Trabalhar em parceria com organizações comunitárias, sociedade civil, instituições religiosas, movimentos sociais e governos locais, para garantir que a mensagem alcance as comunidades afrodescendentes.
- Disseminar o trabalho fundamental, mas invisível, da população negra, que realiza o trabalho nos serviços essenciais, como manutenção, limpeza, atendimento à saúde, entregas e apoio médico. Compartilhar amplamente esta informação pode vir a promover um maior senso de respeito e reduzir a percepção de discriminação racial.
- Expandir a cobertura de programas de transferência direta para proteger a renda da população afrodescendente que trabalha no setor informal e não usufrui de seguro desemprego.
- Garantir o acesso à Internet e tecnologia pelos negros, de maneira a aumentar suas possibilidades de realizar estudo à distância, telemedicina e trabalho remoto.
- Oferecer linhas de crédito e critérios de seleção que priorizem afrodescendentes e fornecedores locais nos processos de compra pública de bens e serviços.
- Gerar espaços virtuais em aliança com o setor privado para vendas, treinamento, mentoria e apoio aos negócios, visando ajudar empreendedores negros a identificar novos mercados e sustentar seus negócios.
Ainda não podemos determinar a extensão dos danos que a COVID-19 irá causar em comunidades afrodescendentes, mas sabemos que ela está revelando desigualdades históricas que podem e devem ser solucionadas de maneira igualitária para todos os cidadãos do Brasil e da região.
* Dados do Brasil demonstram disparidades raciais com relação ao COVID-19, contudo, também sabemos que 32% dos pacientes não declaram sua identidade racial e étnica (Correio 24 Horas, 2019).
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