O transporte público é fundamental para garantir o acesso aos serviços de saúde e atividades essenciais durante a pandemia. Entre as ações governamentais de combate ao coronavírus, mais do que assegurar o deslocamento de profissionais de saúde e de populações vulneráveis, os setores de transporte e mobilidade urbana também podem exercer papel importante para a promoção da igualdade de gênero e aplicação de medidas de proteção às mulheres.
Estudos já mostraram que as mulheres estão na linha de frente do combate ao coronavírus e, por isso, são as mais expostas a ele. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em um levantamento feito em 104 países, 67% dos profissionais da área da saúde e de assistência social são mulheres, sendo elas: assistentes sociais; biólogas; biomédicas; dentistas; educadoras físicas; enfermeiras; farmacêuticas; fisioterapeutas; fonoaudiólogas; médicas; médicas veterinárias; nutricionistas; psicólogas; técnicas em radiologia e terapeutas ocupacionais.
As mulheres representam também parcela expressiva entre os trabalhadores dos setores de serviço e comércio. Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelam que quase metade da força laboral feminina está em condições de informalidade, sendo que cerca de 17 milhões de mulheres realizam trabalho doméstico – setor em que as taxas de informalidade são extremamente elevadas, cerca de 70%.
Além de desempenhar as atividades profissionais, observa-se que as mulheres ainda carregam grande parte da responsabilidade pelos cuidados de crianças e de parentes idosos. Isso faz com que elas sejam particularmente afetadas em situações de pandemia, devido ao fechamento de escolas, creches e asilos. Além disso, a OIT estima que as mulheres realizam 76,2% dos trabalhos de cuidado não remunerado, um número 3,2 vezes maior que o dos homens. Na América Latina, calcula-se que as mulheres destinam entre 22 a 42 horas semanais às atividades de trabalho doméstico e de cuidados.
Devido às condições de trabalho exaustivas e jornadas múltiplas que essas mulheres enfrentam diariamente, são gerados estados de estresse e esgotamento mental. Essas condições podem ser exacerbadas por dificuldades ligadas às dinâmicas de mobilidade diária: insegurança (devido à violência ou ao contágio), tempo de espera em pontos de parada, atrasos, lotação, entre outros. Por isso, é tão importante que medidas adotadas pelos sistemas de transporte público analisem a interseção entre a mobilidade urbana e a pandemia a partir de um enfoque de gênero.
O transporte público como agente de proteção
Na tentativa de diminuir pontos de conflito, a manutenção dos serviços públicos e atividades essenciais é imprescindível no enfrentamento e na superação da situação atual de emergência de saúde. Neste sentido, o transporte público deve manter suas atividades, mesmo que em regime de operação reduzida, visando garantir a mobilidade dessas profissionais e mantendo certa demanda, o que auxilia também as empresas concessionárias a superar esse período de crise.
O desafio é: garantir condições assépticas de mobilidade, com segurança e conforto nos trajetos de ida e volta do trabalho dessas guerreiras que colocam suas vidas em risco, dia após dia. Para tanto, algumas ações têm sido tomadas para garantir a melhoria do atendimento do transporte de mulheres, especialmente durante a atual crise de saúde pública, destacamos algumas delas:
Ações de segurança buscam garantir a proteção das usuárias em relação à violência no transporte público
● Veículos/vagões exclusivos para mulheres profissionais da saúde e auxiliares, com o objetivo de: (i) evitar o assédio; (ii) facilitar a locomoção de ida e volta dos locais de trabalho; (iii) resguardar de eventuais contágios entre os demais usuários.
● Publicar os horários das linhas e incluir sistema de rastreamento georreferenciado, para permitir um monitoramento em tempo real. Isso faz com que se mitigue o tempo de espera nas paradas e estações.
● Criar mecanismos de comunicação de emergência nas paradas de ônibus e estações de transporte ferroviário.
● Disponibilizar informações sobre canais de atendimento psicológico e denúncias de violência.
Ações de comodidade: objetivam o conforto das viagens diárias dessas profissionais que trabalham em condições, muitas vezes, estressantes
● Garantir uma quantidade máxima de passageiras, de forma que possam fazer o percurso sentadas (como em Tallahassee, Estados Unidos);
● Facilitar o acesso à internet nos meios de locomoção e nas estações, permitindo o recebimento de informações, mesmo em locais onde não há cobertura de internet móvel;
● Espaço adequado para colocar os equipamentos, utensílios e pertences pessoais para evitar a contaminação de outras áreas do veículo ou dos vagões.
Ações operacionais: visam reduzir o tempo de viagem e facilitar o acesso ao transporte público
● Disponibilizar vagões e ônibus exclusivos, especialmente nos horários de pico;
● Substituir os tickets de papel por cartão, para reduzir o contato nas estações (como em Auckland, Nova Zelândia);
● Utilizar sistema para recarga dos cartões online ou via aplicativos de celular (como em Auckland, Nova Zelândia);
● Estabelecer tarifa zero ou reduzida para as profissionais que estão atuando no Sistema Único de Saúde (SUS) e para a população vulnerável cadastrada em algum programa de assistência do governo;
● Diagnosticar rotas urbanas estratégicas para atender essa demanda de forma otimizada, com horários que considerem os regimes de plantões.
Ações de profilaxia: medidas para evitar o contágio da COVID-19 e outras doenças infecciosas que podem levar ao afastamento dessas profissionais
● Utilizar sistemas de triagem para medição de temperatura (como nas estações de metrô da China, em Recife-PE ou em supermercado de Guarulhos-SP);
● Limitar o número de passageiras por veículo/vagão (como em Tallahassee, Estados Unidos);
● Fornecer álcool em gel (como em São Paulo-SP), máscaras, luvas, sacolas plásticas descartáveis, lixeiras e outros itens de segurança pessoal;
● Apresentar material informativo sobre profilaxia, como: lavagem de mãos e alimentos; indicação de locais adequados para acomodação dos equipamentos, roupas e utensílios utilizados em ambiente hospitalar; distância mínima entre passageiras (como em São Paulo).