Entre os inúmeros desafios impostos pela COVID-19 ao gestor público, está a complexidade de, ao mesmo tempo, executar medidas para manter a população segura no presente e planejar os passos a serem tomados no futuro.
De acordo com as autoridades sanitárias, enquanto a vacina não é amplamente aplicada, o distanciamento social continua sendo a principal medida para proteger os cidadãos e, mesmo no médio prazo, cuidados com higiene e restrições a aglomerações em ambientes fechados deverão permanecer.
A boa notícia é que, com planejamento e inovação, é possível conciliar esses requisitos com os – desejáveis e necessários – estímulos à ressocialização, como provam os projetos vencedores do concurso de ideias para reocupação dos espaços urbanos “Voltar às ruas”, organizado em 2020 pelo Laboratório de Cidades do BID (site em espanhol).
No fim de fevereiro, algumas dessas ideias foram apresentadas em evento virtual a gestores de administrações públicas que trabalham com a Divisão de Habitação e Desenvolvimento do BID, incluindo representantes das prefeituras de cidades tão diversas como João Pessoa, Niterói (RJ), Novo Hamburgo (RS) e São Luís.
Como bônus, eles também conheceram uma iniciativa desenvolvida pelo BID no Uruguai de melhoria dos espaços públicos com foco em entregadores de compras por aplicativos e conheceram os projetos brasileiros.
A gravação do evento está disponível na íntegra no vídeo abaixo. Também é possível acessar à ata do webinar, que contém especificações dos projetos vencedores.
Criatividade e escalabilidade
Em um debate cheio de ideias criativas, escaláveis e replicáveis, os mais de 90 participantes do webinar “Inovações em espaços públicos para a reabertura das cidades” mostraram entusiasmo com a qualidade e a aplicação prática das propostas compartilhadas.
Foram cinco projetos brasileiros expostos: dos seis vencedores do concurso de ideias, dois são brasileiros; e dos seis projetos destacados com menção honrosa, três tiveram origem no Brasil. Ao todo, o concurso “Voltar às ruas” recebeu 485 propostas, todas enviadas por sociedade civil, grupos de amigos ou acadêmicos – mostrando a potência da colaboração em momentos desafiadores.
Os projetos apresentados são estes abaixo. Os contatos dos responsáveis pelas iniciativas estão na ata da reunião:
VENCEDORES
- Brincando com confiança – a proposta propõe jogos com “tabuleiros humanos” para serem jogados na rua, respeitando o distanciamento social. A ideia é pintar ou projetar os tabuleiros no chão, disponibilizar várias ideias de jogos e incentivar a brincadeira com respeito, integração e segurança. A iniciativa veio do instituto ‘A Cidade Precisa de Você’.
- Ferramentas de esquina – manual para construir peças para locais públicos, como banquinhos de praça ou marcadores de distanciamento para o chão. A ideia é incentivar os moradores a construírem em conjunto esses itens que são simples e podem ajudar, ao mesmo tempo, a integração entre os vizinhos e a prevenção da COVID-19. O manual explica vários aspectos que envolvem a implantação e construção das ferramentas especialmente em territórios vulneráveis (favelas, terras indígenas, entre outros). O projeto é de arquitetos e urbanistas formados pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
MENÇÃO HONROSA
- Adaptação de espaços públicos – a iniciativa propõe um curso para agentes locais, ensinando-os a implantar e a multiplicar soluções para adaptar espaços públicos para a nova realidade. A formação inclui conceitos como urbanismo tático e projeto participativo. Inclui também acompanhamento de concepção e prototipagem. A ideia nasceu no Laboratório de Intervenções Temporárias e Urbanismo Tático da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
- Gambiarra – uma banca de feira sustentável e portátil a ser instalada ao ar-livre, ocupando espaços atualmente usados para carros, é a ideia deste projeto que pretende apoiar a manutenção de atividades comerciais durante a pandemia, minimizando riscos de contágios oferecidos por ambientes fechados. Um projeto do grupo Vão Urbano.
- Parada segura – aqui, a proposta é requalificar o acesso, o entorno e as próprias instalações das paradas de ônibus, tornando-as mais acessíveis e seguras, sobretudo tendo em vista a perspectiva feminina – público que representa 80% dos usuários de ônibus em cidades como São Paulo. Propõe ainda intervenções na vizinhança, nas calçadas e no equipamento que constitui os pontos de ônibus. O projeto é do coletivo T.Urb.A.
A experiência uruguaia
Os gestores públicos tiveram contato também com uma experiência conduzida pelo BID no Uruguai, com foco no aumento expressivo visto durante a pandemia de trabalhadores de entregas por aplicativos – fenômeno experimentado pela grande maioria das cidades da América Latina e Caribe.
Com o objetivo de evitar aglomerações de entregadores que possam se tornar focos de contágio e de conflito urbano com vizinhos, criaram-se áreas de descanso, de estacionamento, de higienização e de convivência para esses trabalhadores informais.
Lições aprendidas
Além dos insights trazidos por cada uma das soluções apresentadas em si, o concurso de ideias e o webinar trouxeram à luz alguns aprendizados úteis para os gestores públicos que têm de lidar com os desafios de planejar cidades durante a pandemia:
- Apesar da COVID-19, a participação e o engajamento popular são possíveis – os projetos apresentados foram concebidos durante a pandemia, com intermediação de ferramentas de encontro online e, sobretudo, com a vontade dos cidadãos de contribuírem para a saída desta crise.
- A co-gestão é fundamental para a sustentabilidade – por mais preparado que seja um governo, suas soluções jamais terão a solidez, a eficiência e a resiliência necessárias para serem sustentáveis no decorrer do tempo que teriam iniciativas propostas com apoio da sociedade civil.
- A inclusão e a integração da população vulnerável são fundamentais – a pandemia escancarou o fato de que a saúde de todos depende do bem-estar coletivo. Uma doença que se inicia em uma cidade do outro lado do planeta pode fazer o nosso país parar. Por isso, é urgente integrarmos e acolhermos todos os cidadãos.
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