Após mais de meio ano de confinamento, cidades do Brasil e da América Latina começam a retomar atividades em espaços públicos com o desafio de não gerarem novas ondas de infecção pela COVID-19.
Diante de uma realidade marcada por desafios e mais dúvidas do que respostas, a inovação e a colaboração têm papel fundamental. Por isso, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) organizou um concurso de ideias, “Voltar para a rua”, que recebeu mais de 485 propostas sobre como reocupar espaços públicos com segurança e inclusão.
A convocatória terminou com seis propostas vencedoras – duas do Brasil – e revelou, além de ideias úteis para o momento que vivemos, o enorme potencial criativo da nossa região.
Conversamos com os vencedores brasileiros do prêmio (Brincando com confiança e ferramentas de esquina), que agora recebem apoio do BID para o amadurecimento dos projetos. A lista detalhando as outras propostas ganhadoras está disponível, em espanhol, aqui.
Como explicar para uma criança de oito anos as propostas de vocês, ganhadoras da convocatória “Voltar para a Rua”?
Equipe da iniciativa “Brincando com confiança”: Para que um espaço funcione, ele precisa que as pessoas que estão lá se conheçam, entendam umas às outras e estejam dispostas a colaborarem. Se criamos a oportunidade para essas pessoas brincarem juntas, unindo forças para completar tarefas e missões – e se divertirem – podemos criar espaços muito mais legais. Por isso, criamos “tabuleiros humanos” para serem jogados na rua, respeitando a necessidade de distanciamento social. A ideia é pintar ou projetar os tabuleiros no chão, disponibilizar várias ideias de jogos e incentivar a brincadeira com respeito, integração e segurança. Por isso o nome “Brincando com confiança”.
Equipe do projeto “Ferramentas de esquina”: A nossa proposta é um manual para construir peças para locais públicos, como banquinhos de praça ou marcadores de distanciamento para o chão. A ideia é incentivar os moradores a construírem em conjunto esses itens que são simples e podem ajudar, ao mesmo tempo, a integração entre os vizinhos e a prevenção da COVID-19. O manual explica vários aspectos que envolvem a implantação e construção das ferramentas especialmente em territórios vulneráveis (favelas, terras indígenas, entre outros).
Qual a reação de vocês ao saberem que foram vencedores do concurso?
Brincando com confiança: Ficamos muito contentes! Desde junho, durante a elaboração do projeto, tínhamos muito interesse em utilizar jogos para potencializar trocas culturais, pensadas desde uma escala micro – a conversa entre usuários de uma mesma praça. Pensamos a solução para diferentes contextos, inclusive para mapear vontades e desejos locais, o que pode ser útil para projetos urbanos participativos.
Ferramentas de esquina – Às vezes ainda parece que não caiu a ficha que ganhamos um concurso internacional! Éramos amigos antes de escrever o projeto para o BID e foi a primeira vez que trabalhamos todos como uma equipe. Somos recém-formados e, com a pandemia, resolvemos nos inscrever. Construímos a proposta totalmente à distância e quando soubemos que foram quase 500 propostas inscritas, sinceramente achamos que não seríamos selecionados. Quando recebemos a notícia por e-mail, foi uma baita surpresa! Mas foi um pouco triste também por não poder sair para comemorar juntos, por conta da pandemia.
E por que vocês acreditam que o projeto de vocês foi um dos escolhidos?
Brincando com confiança: Acreditamos que a forma como o projeto trabalha questões como cidadania ativa, cooperação e a própria confiança entre os habitantes de uma cidade faz com que ele se destaque. Além disso, desde sua concepção ele foi pensado para ser replicado, tendo potencial de utilização em contextos muito diferentes.
Ferramentas de esquina: O diferencial é que focamos muito na execução da proposta. Propomos uma metodologia de construção coletiva e participativa para os bairros, com ferramentas simples e baratas que trazem segurança para o espaço público no cenário de pandemia e pós-pandemia, em especial para os territórios mais vulneráveis. O fato de ser um manual dá autonomia para os próprios moradores e ajuda a replicar a ideia nas mais diversas cidades da América Latina.
O que vocês aprenderam com a pandemia?
Brincando com confiança: Uma pesquisa realizada pela Rede Brasileira de Urbanismo Colaborativo identificou que, isolados, os cidadãos se ressentem de não frequentar espaços públicos com segurança, passear e se divertir. Essa situação evidenciou a importância da convivência entre diferentes grupos sociais. Além disso, se tornaram muito visíveis os efeitos das desigualdades sócio-espaciais em cidades como São Paulo, o que tornou debates como o direito à cidade muito difundidos entre diversas esferas. Para responder a todas essas novas dinâmicas, tivemos de nos reorganizar e rever a forma como trabalhamos, e aprendemos que podemos, mesmo separados fisicamente, utilizar nossas inquietações e nossa criatividade coletivamente.
Ferramentas de esquina: A pandemia ressaltou as desigualdades nas cidades latino-americanas e caribenhas, mas também mostrou a relevância das redes de solidariedade e dos profissionais das mais diversas áreas em territórios vulneráveis. Ao viver sob circunstâncias que, apesar das diferenças, atingem tanto os ricos quanto os pobres, percebemos como estamos todos vinculados enquanto vivemos em sociedade.
Quais são agora os próximos passos do projeto?
Brincando com confiança: Estamos refinando propostas de jogos para torná-las atrativas e, para isso, usamos metodologias emprestadas das artes cênicas, da contação de histórias, da performance e da nossa infância. Em seguida, planejamos testá-las no espaço público, convidando os cidadãos para a elaboração deste primeiro menu de jogos. Buscamos um processo participativo, para garantir a apropriação deste tabuleiro pela comunidade, assim como sua manutenção.
Ferramentas de esquina: Estamos passando por um processo de incubação, em que há um aprimoramento e refinamento da proposta. Há também uma fase de prototipagem, na qual testamos e identificamos possíveis problemas no manual, além de abordarmos questões como escolha das ferramentas adequadas e coerentes a cada local. É um processo colaborativo e de engajamento comunitário que vai nos ajudar a avaliar, revisar e melhorar o manual para que seja o mais efetivo possível.
Leia mais:
Leave a Reply