O ecossistema de startups na América Latina e Caribe (ALC) cresceu consideravelmente na última década. O financiamento para startups na região passou de US$ 0,15 bilhão em 2011 para US$ 15,7 bilhões em 2021, o que representa um crescimento anual de aproximadamente 60% no período, segundo a Associação para o Investimento de Capital Privado na América Latina. Até o final de 2021, a região abrigava 27 unicórnios com avaliações superiores a US$ 1 bilhão. Embora os números de financiamento tenham caído um pouco em 2022, a expectativa ainda é que o empreendedorismo na região continue dinâmico nos próximos anos.
Um ator que tem contribuído de maneira significativa para este dinamismo são as instituições de ensino superior, que têm assumido uma importância crescente para impulsionar a inovação na região. Por isso, vale saber quais medidas as universidades têm colocado em prática para apoiar o empreendedorismo. Essa questão é abordada na publicação “Universidades Inovadoras e Empreendedoras na América Latina” (em inglês), elaborada conjuntamente pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o Banco Santander. O estudo explora questões de educação para o empreendedorismo e atividades de transferência de conhecimento em onze universidades da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México e Uruguai. No caso do Brasil, as instituições participantes foram a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
Principais descobertas
Embora ainda estejam em grande parte associados a escolas de negócios e engenharia, os cursos de educação para o empreendedorismo estão se tornando populares em diferentes faculdades. No caso da UFSCar, por exemplo, há cursos obrigatórios para estudantes de engenharia, mas também são oferecidas disciplinas eletivas para alunos de física, química, educação e psicologia, entre outros. Além disso, como ocorre na UFSCar, na USP e em outras universidades de toda a região, a educação empreendedora está bastante presente em atividades extracurriculares (hackathons, concursos de empreendedorismo, feiras, festivais) e estágios, o que traz mais flexibilidade para os estudantes e, mais importante, promove a interação com stakeholders externos, com empresas de todos os portes e níveis de maturidade.
Abordagens mais comuns
A oferta de educação para o empreendedorismo se apresenta de diferentes formas nas universidades estudadas. Em alguns casos, o objetivo principal é ajudar os alunos a desenvolverem ideias de negócios. Como exemplo, podemos mencionar cursos direcionados para estudantes de ciências e engenharia, bem como doutorandos, que pretendem conectar a ciência e a pesquisa ao mundo dos negócios. Em outros casos, O objetivo central é capacitar e estimular os alunos de todas as disciplinas a adquirir uma mentalidade voltada para o crescimento e para assumir riscos. A expectativa é preparar líderes do futuro.
Contudo, é interessante notar que a maioria das universidades incluídas no estudo está se tornando centros empresariais que apoiam a inovação em seus ecossistemas. Muitas instituições hospedam aceleradoras, incubadoras, centros de empreendedorismo e inovação que, inclusive, são abertos a parceiros externos, como empreendedores e PMEs. A USP criou um centro de inovação (Inova.USP) e a UFSCar tem uma agência de inovação. Nessas iniciativas, as duas universidades coordenam atividades para fortalecer seus ecossistemas de inovação e empreendedorismo e fazem a ligação com empresas e investidores. A USP opera quatro incubadoras. Duas delas, Habits e Cytec, localizadas na capital paulista, já apoiaram respectivamente mais de 500 e quase 2000 empresas criadas por estudantes, incluindo sete unicórnios.
A maioria das universidades incluídas no estudo concentrou suas atividades de colaboração nas comunidades vizinhas aos campi, construindo pontes com empreendedores locais, PMEs, institutos de pesquisa e ONGs. No caso das instituições do Brasil, os esforços são para oferecer treinamento em empreendedorismo para pesquisadores ou realizar pesquisas interdisciplinares para responder aos desafios enfrentados por partes interessadas externas.
Desafios identificados e recomendações
A análise também apontou alguns desafios para universidades, incluindo questões relacionadas à regulamentação de propriedade intelectual que limitam a capacidade de patentear inovação. No caso das universidades do Brasil, por exemplo, foram identificadas dúvidas sobre se os contratos de professores em tempo integral permitem ou não que eles participem de startups, ou sobre como os retornos relacionados à propriedade intelectual podem ser compartilhados entre o corpo docente e a universidade.
Como forma de enfrentar esses desafios, a publicação traz uma série de recomendações para universidades de toda a região:
• Melhorar o conhecimento sobre boas práticas e estabelecer redes continentais entre as diferentes instituições de ensino superior para apoiar a aprendizagem mútua.
• Aperfeiçoar os marcos legais que regulam a propriedade intelectual, tanto em nível nacional como universitário.
• As universidades devem alocar mais fundos para apoiar atividades empreendedoras, colaboração e troca de conhecimentos.
• Desenvolver um sistema de avaliação de impacto (em nível nacional e regional), como um instrumento de aprendizagem essencial para entender como melhorar o desempenho das universidades empreendedoras em termos de troca de experiências e apoio ao empreendedorismo. Essa avaliação também poderia facilitar o desbloqueio do acesso a financiamentos.
A implementação dessas recomendações pode representar um impulso para que as universidades estejam mais bem posicionadas para preparar as próximas gerações de startups bem-sucedidas latino-americanas.
Leia mais sobre a publicação neste texto.
Leave a Reply