A cobrança de pedágio urbano é uma possível solução para problemas como engarrafamentos e contaminação nas grandes cidades, ainda que os motoristas sejam contrários à adoção da medida
Amado Crotte*
O automóvel é mesmo uma grande invenção como fizeram acreditar nossos avós ? É verdade que eles representam conforto, flexibilidade de horários e rotas e espaço para cargas. No entanto, também geram custos sociais como congestionamentos, poluição sonora, acidentes, estresse, perda de produtividade e contaminação do ar, agravando o estado de saúde dos que sofrem de doenças cardiovasculares e respiratórias, além de ser um dos grandes responsáveis pelo aquecimento global.
Mas, então, por que continuamos utilizando carros? Por um lado, porque o transporte público disponível não oferece a qualidade que esperamos e também porque usar veículo próprio, muitas vezes, é mais cômodo. Sem falar que em sociedades emergentes, caso de muitas das nações da América Latina e Caribe, é evidente que o desenvolvimento e a maior disponibilidade de renda levam a um aumento da compra de automóveis, elemento relacionado a um certo status socioeconômico no imaginário coletivo.
Como mudar essa tendência? Uma alternativa é fazer o motorista pagar pelas externalidades que produz. Tradicionalmente pensava-se que os impostos sobre a gasolina, automóveis novos e propriedade de veículos cumpriam esse propósito, o que é incorreto. Os impostos sobre o combustível estão sim associados ao uso de veículos, mas não com o dos congestionamentos provocados pelos carros, enquanto os impostos sobre a compra e a propriedade são um custo fixo. Na realidade eles não incidem negativamente na decisão de comprar um carro.
A ferramenta econômica que pode, sim, capturar os custos sociais produzidos pelos motoristas é a tarifação das vias urbanas, mais conhecida como pedágio urbano. Ha quatro tipos deles. Os dois primeiros, parquímetros e cobrança por tráfego em vias específicas, são amplamente conhecidos. O terceiro consiste na aplicação de tarifas em uma zona delimitada por um cordão e que podem ser fixas e aplicáveis uma vez por dia (como em Londres, na Inglaterra) cada vez que se cruza o cordão (caso de Estocolmo, na Suécia) ou podem ainda variar de acordo com o horário em que se passa pela área delimitada (exemplo de Singapura). A desvantagem desse modelo é que a tarifa não está associada a distância percorrida. O custo por quilometro é menor para veículos que percorrem distancias mais longas, algo que poderia anular o proposito fundamental do pedágio urbano.
Finalmente, a quarta opção, e que melhor representa os custos sociais, se aplica a cada quilometro percorrido. Nesta modalidade a tarifa pode variar por zona de acordo com o nível de congestionamento, hora do dia e emissões contaminantes por veículo. Alemanha, Áustria e Suíça cobram tarifas por quilômetro percorrido de caminhões de carga que utilizam as rodovias interestaduais.
Hoje graças a tecnologia para detecção de uso de veículos (como câmeras com identificação automática do número da placa, sistemas de comunicação de curto alcance, sistemas de posicionamento global e tacômetros) existem dezenas de cidades com programas de pedágio urbano. Essas políticas demonstraram ser efetivas na redução do tráfego veicular e contaminação do ar e garantem recursos adicionais para os governos locais que, na maioria dos casos, são utilizados para melhorar a qualidade e quantidade da infraestrutura disponível para transporte público não motorizado.
É hora de as cidades da América Latina com elevados níveis de congestionamento considerarem esse tipo de política como medida para desmotivar o uso excessivo do automóvel particular, diminuir a contaminação ambiental e obter recursos adicionais para investir em outros modos de transporte. É hora de deixar de pensar como nossos avós .
* Amado Crotte é especialista sênior da divisão de Transporte do BID. Este post foi originalmente publicado no blog Moviliblog
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