Automóvel, uma comodidade e também um transtorno. Foto: Agência Brasil
A analista de sistemas Fernanda se diz uma dependente do automóvel. A última vez em que utilizou transporte público foi em 2011, para comparecer a uma edição da Virada Cultural, evento que fecha algumas vias de São Paulo. Apesar de viver a apenas 3,6 km do local de trabalho, e a menos de 10 minutos de caminhada de um ponto de ônibus, Fernanda utiliza o carro para ir ao trabalho diariamente. Em dias de rodízio, quando não pode circular de automóvel pela cidade entre as 7h e 10h e 17h e 20h, ela pensa em deixar o carro de lado e utilizar o ônibus, mas na “hora H … a comodidade fala mais alto”, relata.
Todas as manhãs, Fernanda sai em seu carro para o trabalho, enquanto o namorado, com quem vive, utiliza outro automóvel para deslocar-se até a empresa onde dá expediente, que também fica a uma curta distância. Além disso, Fernanda diz ter uma colega de trabalho que mora em seu bairro, mas as duas nunca combinaram de irem juntas ao escritório. O motivo? Fernanda admite ser uma questão de individualidade. Para ela, o automóvel acaba sendo um espaço para estar só, ainda que em meio a um congestionamento, e refletir sobre a vida em uma cidade de ritmo frenético, que exige que se esteja conectado todo o tempo.
Os três – Fernanda, o namorado e a colega de trabalho – engrossam as estatísticas da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) segundo as quais a média de passageiros por automóvel em São Paulo é 1,4 – ou seja, a grande maioria dos carros transporta apenas uma pessoa.
Mas por que a preferência pelo carro? Primeiro porque, na maioria das vezes, ainda é mais rápido que o transporte público. De acordo com o Google Maps, Fernanda gastaria 23 minutos em transporte público desde sua casa, na região da Saúde, até seu escritório, na região dos Jardins. De carro, o deslocamento é de oito minutos. A estimativa parece não levar em conta a expansão levada a cabo pela Prefeitura de São Paulo das faixas exclusivas para ônibus que, segundo a analista de sistemas, fez com que seu tempo de deslocamento até o trabalho mais que dobrasse.
Fernanda ainda lista outras razões que vão da pouca iluminação pública na rua que a conduz até o ponto de ônibus – não se sente segura para caminhar por ela sozinha a noite – à questão da comodidade, passando pela lotação dos ônibus. Ela insiste, contudo, saber que privilegiar o transporte individual em grandes cidades é extremamente inviável e se diz a favor de medidas polêmicas como a cobrança de pedágio urbano.
Apesar de passar mais tempo no trânsito agora, Fernanda também se diz favorável às faixas exclusivas, que reduzem o espaço para automóveis e privilegiam o transporte coletivo. Até agora, a cidade conta com cerca de 300 km de faixas exclusivas para ônibus e outros 150 devem ser criados até 2016. E talvez sejam elas, as faixas, que reduzirão a dependência de Fernanda em relação ao automóvel. Como agora ela passa mais tempo no carro, diz estar considerando cada vez mais seriamente utilizar o transporte público.
A lista da Fernanda ilustra bem a complexa situação da mobilidade urbana nas grandes cidades brasileiras. Não há solução milagrosa e melhorias reais só serão alcançadas com o comprometimento de todos. É preciso, sim, melhor planejamento estratégico das diferentes estâncias de governo e, também, mudança de postura da população.
*Fernanda não quis ter seu sobrenome revelado nem ser fotografada para esse post. Ela sente vergonha da sua dependência automobilística.
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