… Enquanto isso, em uma sala de aula em um futuro não muito distante …
Uma das marcas da civilização que antecedeu à nossa era o tratamento desigual dado a homens e mulheres, explicou o professor aos seus alunos da sétima série. Giovanna, a mais perguntadeira da turma, levantou a mão: “Prô, é verdade que no passado atiraram na cabeça de uma menina porque ela queria ir à escola”?
É verdade, sim, Gigi, respondeu o professor para a sala horrorizada. O nome dessa garota é Malala. Ela sobreviveu ao tiro e virou uma ativista mundialmente famosa por lutar pela educação para todas as pessoas. Malala era muito corajosa e por falar a favor dos direitos das meninas irem à escola ela ganhou o Prêmio Nobel da Paz.
“O que é Prêmio Nobel da Paz”? perguntou Davi, o melhor amigo de Giovanna. Marcos, o professor, sorriu. Se ele mesmo havia nascido na geração que não premiava quem lutava pela paz ou contra as injustiças, já que as desigualdades de oportunidade baseadas em gênero e etnia há muito tinham sido abolidas, como esperar que seus jovens alunos, filhos do pós guerra definitivo, não estranhassem a menção ao Prêmio Nobel da Paz, agora só concedido aos que se dedicavam às letras ou a algum tipo de ciência?
Marcos explicou rapidamente a história de Alfred Nobel e a culpa que o sueco sentiu por ter inventado a dinamite. Lembrou que no passado premiavam-se pessoas que lutaram contra o apartheid, como o grande Nelson Mandela, e pelo direito universal à educação, como a jovem Malala. Aproveitando o silêncio quase sepulcral na sala de aula e o ar de curiosidade dos alunos diante dos antigos e estranhos hábitos praticados por seus ascendentes, o professor perguntou: “Vocês sabiam que no passado celebravam o Dia Internacional da Mulher?” O silêncio se aprofundou.
Bem, prosseguiu o professor, deixamos de celebrar essa data, que era comemorada no 8 de março, mas seguimos ensinando aos alunos que, no passado, mulheres ganhavam menos que os homens. Giovanna e Davi entreolham-se com cara de espanto. E não só isso, emendou Marcos. O trabalho doméstico, que por muito tempo foi uma atividade exclusivamente feminina, era mal remunerado e, muitas vezes, gratuito. Mulheres também eram tidas como incapazes de aprender e trabalhar em carreiras nas áreas cientificas. A sala irrompeu em gargalhada. A mãe de um dos alunos era a maior autoridade em Astrofísica Computacional da atualidade.
Passado o burburinho causado pela informação de que no passado havia carreiras para mulheres e outras para homens, uma das alunas quis saber: “Professor, por que decidiram celebrar esse dia internacional da mulher?”
Marcos explicou que a data tinha sido criada justamente para celebrar os esforços das mulheres pela igualdade. Em 8 de março de 1857 trabalhadoras que protestavam contra as péssimas condições de trabalho em uma fábrica nos EUA foram reprimidas pela polícia e acabaram trancafiadas dentro das instalações, onde morreram carbonizadas.
Apesar das represálias, as mulheres nunca pararam de lutar. Em um momento em que as coisas já não eram tão bárbaras, uma atriz fez um discurso emocionado no Oscar pedindo igualdade salarial. Naquele ano só se falou disso, comentou o professor. Mas esses tempos ficaram para trás e por isso já não se celebra mais o Dia Internacional da Mulher há tantos anos.
A aula e a explicação acabam. Na saída do colégio, um pensativo Davi diz à amiga Giovanna: “Como os nossos antepassados eram bárbaros. Como podiam viver daquele jeito? Ainda bem que eu não nasci naquela época”.
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