Favelas verdes: painel solar na comunidade carioca Vale Encantado
Eliot Allen*
Painéis de energia solar destacam-se no meio da luxuriante vegetação da maior floresta urbana do mundo: o Parque Nacional da Tijuca, no Rio de Janeiro. Esses painéis ficam nos telhados dos moradores, que administram a produção de biogás oriunda de lixo orgânico e ainda trabalham no protótipo de um pequeno gerador hidráulico.
Tudo isso acontece em um lugar que tem nome de conto de fatas: Vale Encantado. Porém, esse vale não é um dos muitos condomínios de luxo espalhados pelo Rio e sim uma favela que, como muitas outras mundo afora, representa o lado mais sombrio do acelerado desenvolvimento urbano nas nações modernas.
Mas como foi que uma favela conseguiu implementar tecnologias sustentáveis tradicionalmente associadas aos bairros de alta renda? Em resumo, tudo foi feito em três passos, que explicaremos em breve. Mas antes de prosseguir deixem-me dizer que a experiência do Vale Encantado representa um modelo promissor que demonstra como as favelas podem transformar-se em motores social e econômico, um lugar no qual empreendedorismo e criatividade são o caminho para melhores oportunidades para quem reside ali.
O melhoramento de assentamentos informais reconhece, cada vez mais, a vitalidade econômica e social dessas comunidades, onde criatividade e empreendedorismo podem levar a um reordenamento que resulta em melhora das condições de vida e bem estar. Ao mesmo tempo, “uma nova geração de arquitetos com vontade de fazer a diferença esta emergindo” nas favelas, como observa Justin McGuirk em Radical Cities.
Painéis solares, biogás, espaços verdes. Uma favela mostra que tudo isso é possível.
Um método promissor para alcançar esses objetivos é o LEED UP. Ele alia as necessidades da comunidade ao conhecimento de profissionais da sustentabilidade que aplicam estratégias verdes de Leadership in Energy and Environmental Design (LEED) pelas Américas. Os moradores das favelas selecionam e adaptam estratégias de sustentabilidade que atendam às suas demandas mais urgentes e gerem empregos. São eles que definem as ações catalisadoras que darão início às estratégias; as ações são implementadas com parceiros LEED e a cooperação de organizações. O resultado e melhoria com retornos triplicados: novos empregos e fortalecimento do tecido social. Além disso, há mais chances de que as melhorias sejam permanentes.
Plano estrutural
O LEED UP é tanto um plano estrutural quanto um processo de melhoria. O plano ordena assentamentos em dez componentes de sustentabilidade: habitação, água, saneamento, alimentação, educação e saúde, acesso e mobilidade, espaços comuns, energia e comunicações, resíduos sólidos e restauração e resiliência. Esses dez componentes formam um sistema entrelaçado de estratégias e metas para melhorias verdes – dependendo das necessidades locais. Nem todos os componentes aplicam-se a todos os assentamentos e algumas comunidades podem acrescentar componentes que façam sentido somente para elas.
Processo
O processo LEED UP destina-se aos residentes e empreendedores de assentamentos e favelas, como o Vale Encantado, que tem um certo nível de segurança fundiária, auto governança estabelecida e uma entidade empresarial, conectada com iniciativas de escala territorial, que possa ser a “responsável” pelo plano final. Os participantes concluem uma jornada de palestras/workshops com apoio da equipe LEED UP, o que inclui um facilitador, um arquiteto/engenheiro local e um estrategista LEED. Eles conhecem um processo de quatro etapas: 1 – selecionar e adaptar as estrategias LEED para suas necessidades mais urgentes; 2 – priorizar estrategias que criem empregos locais e sinergias econômicas; 3, – criar as acoes catalizadoras necessárias para promover as estrategias prioritárias e, finalmente, identificar os profissionais LEED e outros parceiros que possam apoiar as acoes catalizadoras.
Resultados
O método foi aplicado no favela Vale Encantado com resultados encorajadores, incluindo estratégias para processamento de biogás, geração de energia hídrica e espaços de recreação adaptados ao terreno. Outras experiencias piloto ajudarão a dar forma a um processo robusto para amplo uso. O objetivo é criar um arcabouço replicável e escalável para colaboração verde e investimentos em partes criticas das cidades. A colaboração pode criar novas oportunidades econômicas e sociais para os pobres ao mesmo tempo em que se promove urbanismo sustentável para todos.
*Eliot Allené um planejador urbano e regional com foco no nexo entre planejamento de comunidades e sustentabilidade. Desde a criação da Criterion Planners, em 1979, ele e reconhecido nacionalmente nos EUA como um líder no uso de tecnologia da informação para ajudar designers e cidadãos a criarem espaços mensuravelmente mais responsáveis ambientalmente. Eliot foi membro fundador do Instituto Americano de Planejadores Certificados e também foi presidente da Comissão de Sustentabilidade de Portland.
** Este post foi originalmente publicado em Urbe y Orbe, o blog de desenvolvimento urbano do BID
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