José Miguel Benavente*
A popular frase atribuída a Thomas Edison que diz: “a genialidade é 1% de inspiração e 99% de transpiração” tem se aplicado a diversas áreas, desde a criatividade a inovação, passando pelo trabalho científico, sucesso empresarial até obras artísticas. A América Latina e Caribe necessitam de 1% de inspiração e 99% de transpiração para crescer e se desenvolver?
Se olharmos a renda per capita dos países como uma carreira ciclística, vemos que enquanto nações de outras regiões vão se somando ao pelotão da frente, os países da região se encontram bem atrás na pista e poucos tem o perfil para deixar esta situação. A pergunta é: em um contexto em que todo mundo está se movendo, o que os países parecidos aos da ALC fizeram para alcançar a dianteira?
Transpiração
Existem duas formas de crescer, economicamente falando. Uma é transpirando, o que implica muita economia, muitos investimentos, muita infraestrutura, ampliação de novas empresas, mais emprego independentemente do talento e a capacidade alcançada através da educação.
Neste sentido a América Latina tem feito relativamente bem os deveres nos últimos 10 ou 15 anos, e isso explica porque alguns países, hoje, estão liderando o pelotão dos países emergentes. As taxas de economia e investimentos têm sido bastante altas, estão fazendo muitas obras físicas, cumprindo metas macroeconômicas, os preços estiveram relativamente bem, conseguiram bancos centrais independentes, entre outros êxitos. O que os países da região tem feito é algo positivo, é uma condição necessária para nos desenvolvermos. Mas continuar fazendo mais do mesmo, crescendo por transpiração, não é suficiente.
Inspiração
Análises de longo prazo sugerem que alcançar a dianteira está quase em sua totalidade vinculado ao uso mais inteligente de ferramentas e materiais orientados ao desenvolvimento de novos produtos, serviços e setores que antes não possuíam. Essa faceta do crescimento é a outra forma de crescer, e é o que chamamos de inspiração.
E o eixo central sobre o qual está à estratégia de desenvolvimento por inspiração é a inovação, embora muitas vezes não mencionada de forma explícita ou desconhecida conceitualmente. A inovação é entendida como o mecanismo de incorporação de um novo conhecimento ou de um novo uso do conhecimento que pode gerar valor. Valor não apenas para uma empresa ou um setor produtivo que pode ter maior rentabilidade mediante a implementação de novas tecnologias ou processos, mas também por gerar valor para a sociedade como um todo através de soluções para problemas chave através de inovações em saúde, segurança, meio ambiente, organização da cidade, mudança social, entre outras.
Inovação
A forma de criar valor mediante inovações tem múltiplas formas ou caminhos. Através da ciência e da tecnologia são gerados conhecimentos e avanços técnicos necessários para desenvolver novos produtos, processos e serviços. Também mediante o empreendimento, o surgimento de novas empresas que estabeleçam modelos de negócio para introduzir estas inovações ao mercado. Desde cedo, o setor privado por definição busca gerar valor com o que produz e o oferece buscando satisfazer as necessidades não só dos clientes nacionais, mas também fora das fronteiras do país. O Estado também pode ser um ator chave como produtor de novas soluções para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos em múltiplas e complexas dimensões.
Incorporar o novo conhecimento em uma sociedade não é uma tarefa fácil. E ainda menos se tal conhecimento é orientado a gerar valor. Portanto, a necessidade da junção de aportes de vários atores para buscar gerar valor na interação entre eles. A isto se refere à ideia da Triple Hélice (uma inovação a partir do Triângulo Sabático), a união do mundo público, das universidades, centros de pesquisa e das empresas para gerar inovação.
América Latina e o Caribe
Infelizmente é no esforço de inspiração de cada um destes atores em que nossa região está mais fraca. E o pior de tudo é que, através do tempo, estamos retrocedendo com relação aos países que nos antecedem. Em cada uma das formas que utilizam para medir este esforço, todos os países sem exceção estão muito atrasados.
Esforços importantes têm sido concentrados não apenas em investimentos de recursos, mas também em melhorar a institucionalidade para gerir a inspiração, com a criação de ministérios, conselhos nacionais, grupos empresariais, redes universitárias e científicas voltadas para a inovação. Porém, considerando a experiência de outras partes do mundo, necessitamos dar mais sustentabilidade ao desenvolvimento econômico e humano da região.
Três pontos sobre a i
1 – Talvez o aspecto que falta e mais chama a atenção não são os baixos esforços que fazem cada um dos agentes, mas sim a falta de conexões e vínculos entre eles. Este é o espaço onde se pode dar um grande passo para unir o mundo científico e o acadêmico com o produtivo e social buscando gerar novas ideias e que estas possam se transformar em valor.
2 – É fundamental que o Estado busque complementariedades com o mundo produtivo para desenvolver inovações, assim como também solicite ao mundo científico e tecnológico respostas e propostas de soluções a problemas técnicos próprios das tarefas do Estado. Sofisticar o Sistema Nacional de Inovação foi a estratégia que muitos países, hoje desenvolvidos, utilizaram ativamente.
3 – Tanto a experiência destes países exitosos como a mesma teoria econômica nos mostram que existem diversas falhas que impedem que os ecossistemas de inovação floresçam sob a mão invisível da economia de mercado. Daí que todos os países, ricos e em desenvolvimento, capitalistas e da corte socialista invistam em recursos públicos em diferentes atividades relacionadas com a inovação.
Não existe país no planeta nem sociedade na história que tenha melhorado a qualidade de vida de seus cidadãos sem ter incorporado um novo conhecimento, inovação e produtividade às suas atividades econômicas, educativas e sociais. A receita de como realizar esta tarefa não é única e está repleta de obstáculos. O que está comprovado é que ainda que a transpiração seja um requisito, se trata de um caminho com muito mais que 1% de inspiração.
Post publicado originalmente em espanhol no blog do BID, Puntos sobre la i
* José Muiguel Benavente é chefe da Divisão de Competitividade e Inovação do BID. Antes de unir-se ao BID em 2014, desenvolveu uma carreira de destaque como professor, pesquisador e autor de temas de desenvolvimento econômico, inovação e produtividade, I+D, pymes, empreendimento e micro econometria, entre outros. Também foi consultor de organismos internacionais, conselheiro de governo e vice-presidente do Conselho Nacional de Inovação do Chile. José Miguel é engenheiro civil industrial pela Universidade do Chile, mestre e PhD em Economia pela Universidade de Oxford, na Inglaterra.
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