Há dois anos monitoramos o panorama das fintechs na América Latina, e não é novidade que o Brasil é o maior player do ecossistema, com 33% do mercado. Entretanto, quando o tema é equidade de gênero, os números no Brasil são mais desafiantes. Aproximadamente 24% das fintechs brasileiras foram fundadas por uma mulher ou contam com uma mulher na equipe fundadora.
Ainda que o Brasil esteja acima da média mundial estimada em 7%, o país está atrás da média da América Latina, de 35%, e atrás do Uruguai (47%) e Peru (45%). Mesmo quando vemos o total das Fintechs na América Latina, o Brasil está por trás dos outros dois maiores mercados da região México e da Colômbia, que explicam a maior parte das fintechs fundadas por mulheres, com 31% e 14% do total, respectivamente, enquanto que o Brasil, 12%, segundo nosso relatório.
Na América Latina, quase 80% das fintechs têm pelo menos uma mulher em seu quadro de funcionários e, em média, 30% dos funcionários das startups de fintech são mulheres. No entanto, apenas cerca de 11% das startups do setor têm 50% ou mais de mulheres trabalhando em suas equipes. No caso do Brasil, 7,5% das fintechs contam com 50% ou mais de mulheres na equipe.
Para compreender melhor os desafios por trás de uma maior equidade de gênero nas fintechs, conversamos com a María Laura Cuya, CEO da Innova-funding e fundadora da FactoringLab, que compartilha sua visão de negócio e de futuro.
GA: Qual é o seu cargo atual?
MLC: Sou CEO da innova-funding.com (primeiro mercado peruano de duplicatas) e fundadora do site FactoringLab.com (dedicado à cobrança de duplicatas). Em ambos, temos 50% de participação feminina (acionistas e funcionárias).
Outro cargo relacionado a fintech que ocupo é a presidência da Associação Peruana de Fintechs (Asociación Fintech del Peru), da qual fui uma das fundadoras em 2016. Em 2017, formalizamos a câmara e hoje articulo a direção e promovo sinergias para que favoreçam os propósitos dos associados no mundo das fintechs de meu país e da região. Meu cargo é ativo na minha empresa e na associação, sempre com foco na promoção da inclusão financeira para as MPMEs.
GA: Quando você se envolveu com o ecossistema de fintech na América Latina?
MLC: Quando fundamos a Innova-Funding, percebi as necessidades de soluções tecnológicas nascentes (capital, fornecedores de fintech, regulamentação, etc.). No meu país, o mundo de fintech era novo até 2016. Ao entrar em contato com outros países, como Colômbia, México, Chile e Espanha, percebi que eles enfrentavam as mesmas dificuldades e que, em muitos casos, eles já tinham percorrido um caminho mais longo. Isso me fez pensar que havia maneiras de catalisar as experiências da América Latina e que criar uma associação nos ajudaria a acelerar o nosso crescimento, ter uma frente unida diante dos novos desafios do Peru e nos integrarmos para gerar sinergias.
GA: O que você mais gosta nas Fintechs?
MLC: Sou fascinada pela possibilidade de fazer mudanças na vida de milhares de pessoas, de que nossas soluções democratizem as oportunidades para os mais necessitados e que seja conquistada uma inclusão financeira real.
Sou apaixonada pelo fato de que a Innova-Funding contribui para mudar a vida dos microempresários. Na lnnovaFunding, treinamos as micro, pequenas e médias empresas mensalmente em factoring e duplicatas negociáveis, além de estarmos comprometidos em promover o fortalecimento das capacidades das mulheres microempresárias. Na associação, estamos comprometidos com a visibilidade das mulheres empreendedoras. Criamos eventos, onde as fundadoras ou a liderança são as palestrantes/apresentadoras.
GA: Quais são os maiores desafios que as mulheres enfrentam no setor de fintech na América Latina? Nesse aspecto, quais foram os principais desafios que você teve que superar como empreendedora?
MLC: Finanças e tecnologia geralmente têm menos mulheres. Por exemplo, a Alianza FinTech IberoAmérica organizou um congresso em 2017 e outro em maio de 2018. Dos 20 países representados pelas 13 associações, há apenas uma mulher em uma representação, que é a do Peru. Nas startups de fintech peruanas, temos 30% de mulheres fundadoras e 40% de diretoras ou gestoras em funções de destaque.
GA: Quais ações podem ajudar a superar esses desafios?
MLC:
1. Visibilidade, apresentação de casos de diretoras executivas ou fundadoras
2. Promoção de políticas públicas regionais
3. Promoção de uma maior participação feminina na força de trabalho para reduzir as desigualdades
4. Reforçar a qualificação das mulheres nas Fintechs. Na InnovaFunding, treinamos as MPMEs, dando ênfase às lideradas por mulheres
GA: Que mensagem ou conselho você gostaria de transmitir às mulheres da região que estão pensando em lançar sua startup de Fintech?
As fintechs nos permitem oferecer soluções expansíveis e de grande alcance. As mulheres têm habilidades interpessoais muito poderosas para criar startups de fintech (resiliência, adaptabilidade à mudança, compreensão empática dos problemas do usuário, inteligência emocional, gerenciamento de crises, empatia com as partes interessadas, liderança positiva de equipes de trabalho, etc.).
Se acrescentarmos experiências e habilidades, poderemos criar soluções de fintech de alto impacto. É um bom momento para que as mulheres latino-americanas se convençam e se atrevam a fazer parte dos desafios de fintech, que andam de mãos dadas com a educação, a inclusão e a democratização financeira.
Uma empresa fintech sem mulheres na equipe de liderança e no quadro de funcionários limita naturalmente sua capacidade de promover a democratização financeira. Ao contar com perspectivas de apenas um gênero nas tomadas de decisão, estes negócios se tornam menos disruptivos e menos capazes de atender às necessidades de seus clientes e potenciais clientes.
A brasileira Nubank, hoje a maior Fintech da América Latina, por exemplo, é co-fundada por uma mulher, a Cristina Junqueira, que também é VP de Branding e Business Development. Esse balanço de gênero claramente contribui para o sucesso e escala do negócio. Que mais fintechs possam se beneficiar do poder da equidade de gênero em suas operações.
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