Yuri Soares e Maria Elena Nawar*
Quando foi contratado para trabalhar em um canteiro de obras do metrô no Rio de Janeiro, Diogo Barbosa não deu muita importância ao caminho que o levou das ruas de uma favela do Rio ao local de trabalho de um emprego formal bem remunerado. Tampouco estava preocupado com as habilidades que havia adquirido ao longo da vida e em como estas seriam cruciais para o seu sucesso. Em vez disso, estava decidido a aproveitar ao máximo a oportunidade que lhe estava sendo apresentada. Diogo é um daqueles empregados de quem os patrões realmente gostam. Chega sempre pontualmente ao trabalho, e muitas vezes fica até mais tarde, se necessário. De acordo com o seu supervisor, Diogo jamais deixa escapar uma oportunidade de aprender uma nova habilidade. Toma a iniciativa de ajudar os colegas a realizar seu trabalho. Além disso, é conhecido por resolver problemas complicados, e os colegas muitas vezes recorrem à sua ajuda.
Diogo domina várias habilidades – conhecidas como habilidades socioemocionais, não cognitivas ou “soft” – que os empregadores normalmente identificam como fundamentais para o sucesso no trabalho. Disciplina, iniciativa, solução de problemas, confiança: esses são alguns dos atributos que o supervisor de Diogo valoriza em seus empregados. Mas como e quando essas habilidades são adquiridas? Programas e políticas podem ajudar no desenvolvimento dessas habilidades e, em caso afirmativo, como?
Diogo foi um dos jovens formados pelo Galpão Aplauso, um programa de capacitação de jovens do Rio coordenado por uma organização não-governamental e financiado pelo Fundo Multilateral de Investimentos do Grupo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O Galpão usa atividades de artes cênicas para desenvolver habilidades profissionais, acadêmicas e socioemocionais em jovens de 15 a 29 anos. O programa melhorou sensivelmente a empregabilidade de participantes como Diogo. As habilidades que os jovens aprenderam e as redes que construíram durante o programa de seis meses acabaram por resultar em taxas de emprego mais elevadas e trabalhos mais bem remunerados, segundo um estudo randomizado controlado (ERC) realizado pelo BID e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
Mas teriam esses impactos sido impulsionados pela formação profissional ou acadêmica, ou pelo desenvolvimento socioemocional? Os resultados do ERC apresentam estimativas precisas do impacto global do programa, mas não associam os impactos às suas respectivas causas. Somente agora a literatura especializada está começando a desvendar o impacto das habilidades técnicas, acadêmicas e socioemocionais no sucesso do trabalho.
Habilidades socioemocionais são geralmente definidas como aquelas que nos permitem ser bem sucedidos na gestão de situações e eventos sociais e interpessoais. Estão relacionadas com traços psicológicos, mas diferentemente dos traços são maleáveis e podem ser moldadas pelas nossas experiências, especialmente no início da vida. O desenvolvimento do cérebro condiciona como e quando essas habilidades são aprendidas. Algumas somente podem ser aprendidas no início da vida e já estão muito bem configuradas quando se chega à adolescência. Outras se desenvolvem mais tarde na vida. Muitas das habilidades socioemocionais importantes para o sucesso no mercado de trabalho continuam a se desenvolver durante a adolescência e no início da idade adulta, como indicado em um recente artigo de Nancy Guerra, Kathryn Modecki e Wendy Cunningham. Habilidades relacionadas com confiança, iniciativa, disciplina e controle, bem como com a solução de problemas, podem ser moldadas até meados e final dos 20 anos.
Hoje há um consenso na literatura da economia e da psicologia de que as habilidades socioemocionais são fortes determinantes dos resultados apresentados pelos jovens, incluindo resultados relacionados ao trabalho. Na verdade, uma crescente base de evidências mostra que essas habilidades competem com as habilidades acadêmicas ou técnicas em sua capacidade de prever emprego e salário, dentre outros resultados, como mostra uma recente revisão bibliográfica realizada por Tim Kautz e outros. Na medida em que os locais de trabalho tornaram-se cada vez mais complexo em todo o mundo, a demanda por essas habilidades aumentou nos últimos 20 anos. Os empregadores valorizam cada vez mais essas habilidades socioemocionais – que raramente conseguem encontrar – e estão mal aparelhados para fornecê-las. Um recente exame das habilidades valorizadas por empregadores identificou nada menos do que 140 diferentes subtipos de habilidades socioemocionais.
O que tudo isso significa para as políticas destinadas a ajudar os jovens a serem bem sucedidos?
Há muitas notícias boas. O consenso de que as habilidades socioemocionais são fundamentais para o sucesso na vida e no trabalho tem, em sua maior parte, atingido os formuladores de políticas. A maioria dos programas para jovens hoje incorpora um foco no desenvolvimento de habilidades socioemocionais. Além disso, a economia subjacente às habilidades socioemocionais, sua relação com a ciência do desenvolvimento neurobiológico, bem como as ferramentas para medirmos essas habilidades estão avançando rapidamente. Isso também é uma boa notícia, já que essa pesquisa acelerada pode ser usada para melhorar o desenho e a implementação de programas. E há muitos fóruns disponíveis em que acadêmicos e profissionais podem trocar informações.
Obviamente, ainda há muitos desafios a serem vencidos. Não sabemos como medir adequadamente as habilidades socioemocionais. Não temos um entendimento claro de que estruturas de programas funcionam melhor para o desenvolvimento de cada uma dessas habilidades. E temos pouquíssimos dados granulares sobre a importância de diferentes habilidades para os resultados do mercado de trabalho. Esses obstáculos terão de ser superados se quisermos criar melhores programas para propiciar a jovens como o Diogo maiores chances de sucesso.
*Post publicado originalmente em inglês no blog FOMIN
*Yuri Soares é Chefe de Eficácia no Desenvolvimento no Fumin, onde supervisiona a agenda de eficácia no desenvolvimento. O Dr. Yuri é PhD em Economia pela Universidade Estadual de Michigan e mestre em Economia Agrícola pela Universidade da Flórida. Trabalhou nos EUA e no Brasil.
*Maria Elena Nawar, especialista líder no Fundo Multilateral de Investimentos (Fumin), está criando uma estrutura mais rigorosa de monitoramento e avaliação para os projetos e produtos do Fumin, bem como trabalhando em mudanças para melhorar a gestão de resultados e riscos e racionalizar procedimentos fiduciários.
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