O transporte se transformou em uma das principais fontes de emissões de gases de efeito estufa do setor energético no Brasil. Dados do Observatório do Clima apontam que o setor representou 47% do total das emissões de energia em 2019, com transporte de cargas sendo responsável por 40% desse total – as emissões provêm principalmente da queima de combustíveis fósseis, especialmente gasolina e diesel. Esse contexto faz com que a diversificação nos modos de transporte e melhor planejamento logístico sejam centrais para a rota de descarbonizaçãodo Brasil.
Desafios de Logística e Transporte
Hoje um dos maiores desafios relacionados à logística no Brasil é a dependência do modo rodoviário. As longas distâncias percorridas nesse modo levam não só a um alto custo do transporte, mas também a uma maior emissão de gases de efeito estufa. Um outro importante desafio refere-se à pavimentação da extensa malha rodoviária brasileira, que tem 1.563,6 mil quilômetros[1], dos quais apenas 13,7%[2] são pavimentados. Estudos estimam que o tráfego em vias inapropriadas pode levar a um desperdício médio de 5%[3] do volume total de diesel.
A produtividade, a integração regional e o comércio internacional do Brasil também são dependentes de infraestrutura de qualidade. De acordo com o Fórum Econômico Mundial, em 2019 o Brasil ocupava a 85ª posição entre 141 economias[4] em termos de qualidade geral de infraestrutura de transporte. Apesar de uma melhoria comparado a anos anteriores, a atual matriz de transporte resulta em custos de transportes elevados, equivalente à mais de 6% do PIB nacional. Aproximadamente 65% das cargas do país são transportadas por rodovias, com um percentual menor transportado por ferrovias, hidrovias, cabotagem, dutos e aviões.
Melhorias na eficiência de transporte e na qualidade de infraestrutura são centrais para competitividade do país e redução das emissões do setor. Para que haja uma melhoria nesse sentido, investimentos substanciais serão necessários, especialmente de fontes alternativas e sustentáveis. Mundialmente, estima-se que US$ 90 trilhões em investimento serão necessários no setor de infraestrutura até 2030. Considerando que a transição para uma economia verde cria oportunidades e geração de emprego, temos um potencial de retorno de US$ 4 para cada US$ 1 investido. O financiamento por fontes tradicionais tem se tornado um desafio e há potencial de acessar recursos no mercado de capitais para financiar projetos de infraestrutura de transporte rodoviário, ferroviário, portuário, urbano e logística que englobe que contemplem práticas Ambientais, Sociais, e de Governança – ASG. Esse investimento será essencial para retomada da economia e competitividade brasileira.
Transformação do Setor de Logística e Transporte
Um estudo recente do BID sobre infraestrutura e serviços destaca a correlação entre investimentos em ativos de infraestrutura e prestação de serviços, uma vez que esses serviços dependem da capacidade e qualidade da infraestrutura. O processo de planejamento, gestão, regulação e operação da infraestrutura se torna fundamental para disponibilidade e qualidade dos serviços de infraestrutura. No setor de transporte, por exemplo, a interação de serviços logísticos multimodais exige uma boa conectividade entre rodovias, ferrovias e portos.
O planejamento de infraestrutura deve integrar princípios de sustentabilidade e risco climático. Ao se construir ativos mais resilientes, menor será o impacto dos eventos relacionados ao clima, quer seja em relação a durabilidade de rodovias e outros modos de transporte, com a ocorrência de eventos extremos, ou em relação à redução das interrupções dos serviços prestados, evitando prejuízos econômicos. Outro fator importante à resiliência de ativos de infraestrutura é a manutenção adequada desses ativos.
Nesse sentido, o Ministério da Infraestrutura estabeleceu o Planejamento Integrado de Transportes – PIT, que tem por objetivo estabelecer uma lógica sistêmica e intermodal de planejamento de transportes. O PIT é composto a nível estratégico, i) pelo Plano Nacional de Logística – PNL, ii) e, a nível tático, ii) pelos Planos Setoriais específicos de cada modo de transporte (Plano Setorial Terrestre, Plano Setorial Portuário, Plano Setorial Hidroviário e Plano Aeroviário Nacional), iii) pelo Plano Geral de Parcerias, e iv) Plano Geral de Ações Públicas.
O PNL identifica, por meio de indicadores (p. ex., de custos de transporte e emissões de gases), as necessidades e oportunidades, presentes e futuras, de oferta de capacidade dos subsistemas de transportes, além de traçar perspectivas de movimentação de pessoas e bens e identificar um conjunto de infraestruturas de transporte com alta relevância nacional, considerando os diversos cenários possíveis no horizonte de planejamento.
Todos esses elementos contribuem para um setor de transporte e logística mais sustentável e resiliente, que levam a uma menor emissão de gases de efeito estufa, maior segurança e eficiência. Além de termos resultados vantajosos no longo prazo com essa abordagem, algumas soluções já estão sendo introduzidas como a utilização de transporte intermodal e multimodal, otimização de rotas e processos. Por exemplo, de acordo com os cenários simulados no PNL 2035, com projetos já em andamento, observa-se que os resultados apontam para uma matriz de transporte mais equilibrada, com maior participação dos modos de grande capacidade, como as ferrovias, e, por consequência, com menor custo e ambientalmente mais sustentáveis.
Para o setor rodoviário, o desafio é maior, mas existem formas de minimizar o impacto ambiental por meio de práticas sustentáveis, como, por exemplo, a utilização de combustíveis menos poluentes, priorização de veículos com tecnologia limpa, renovação de frotas de veículos e novas tecnologias de pavimentação.
Percebe-se, dessa maneira, que a questão da sustentabilidade tem sido uma diretriz do Ministério da Infraestrutura, que vem levando em consideração, nas suas políticas e ações as questões atinentes a meio ambiente e mudança do clima.
Uma Rota para Sustentabilidade
Em que pese os avanços já observados, para se alcançar um sistema de transporte mais sustentável e inclusivo, aprimoramentos ainda podem ser implementados. Com esse desafio a frente, o BID, em parceria com o Ministério da Infraestrutura, desenvolveu o Projeto Infralog: Transporte e Logística Sustentável no Brasil, com o intuito de identificar e criar soluções para planejamento, gestão, operação, manutenção e financiamento de ativos de infraestrutura de transportes. O projeto recém aprovado, receberá recursos do Programa de Infraestrutura Sustentável do Reino Unido (UKSIP), que visa mobilizar investimentos para projetos de infraestrutura sustentável.
Um dos componentes do projeto será voltado a análise do impacto econômico de logística e transporte sustentável, considerando projetos existentes e planejados, bem como projeções para futura expansão. Outro componente contempla o fortalecimento do processo de governança e gestão de transportes, por meio da inserção da temática de sustentabilidade em componentes do Planejamento Integrado de Transportes. Por fim, o terceiro componente abordará os desafios de financiamento para transporte e logística resiliente e de baixo carbono, buscando soluções para atrair investimento privado e identificando novos instrumentos para investimento no longo prazo, considerando os desafios nas concessões de infraestrutura.
Nessa perspectiva, a primeira etapa irá embasar a definição de um modelo de governança, contemplando objetivos, metas e indicadores, para o plano de parcerias do modo rodoviário, numa perspectiva sustentável, e podendo servir de subsídio para a definição dos elementos similares nos demais planos de parcerias inseridos no âmbito Planejamento Integrado de Transportes do Governo Federal.
O Brasil está na rota certa para descarbonizar o seu setor de logística e transporte, mas ainda há oportunidades de melhorias para que essa transformação seja ainda mais sustentável. A integração de sustentabilidade no planejamento de logística e transporte, a integração do risco climático e da mobilização de investimentos para infraestrutura sustentável são um passo nessa direção. Em um cenário pós-pandemia, a reconstrução e construção pautados pela agenda ASG se tornam ainda mais relevantes para recuperação econômica, e o Projeto do Infralog trará importantes insumos para essa transformação.
[1] Fonte: Ministério da Infraestrutura / Síntese Setor Rodoviário (https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/dados-de-transportes/dados-de-transportes/sintese-rodoviario)
[2] Fonte: Ministério da Infraestrutura / Síntese Setor Rodoviário (https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/dados-de-transportes/dados-de-transportes/sintese-rodoviario)
[3] Fonte: Pesquisa CNT de rodovias 2019, pág 183 – “Dados de Bartholomeu (2006) na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, da Universidade de São Paulo – ESALQ-USP. Essa tese adotou como referência a Pesquisa CNT de Rodovias de 2005 e o desempenho de caminhões em rotas com diferentes condições de pavimentação.”
[4] Fonte: Global Competitiveness Report 2019 – Fórum Econômico Mundial, pág 110 (http://www3.weforum.org/docs/WEF_TheGlobalCompetitivenessReport2019.pdf)
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