Em um contexto de governos cada vez mais digitalizados, aumenta também a necessidade constante de fortalecer os mecanismos de segurança digital. Afinal, serviços autenticados, dados de cidadãos e processos precisam operar em um ambiente seguro. É diante de desafios como este, que o setor público brasileiro tem muito a ganhar ao trabalhar com empresas tecnológicas e de impacto social que fazem parte do ecossistema de inovação do país, oferecendo assim soluções mais custo-efetivas aos cidadãos.
Foi o que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fez, por exemplo, ao migrar a identificação dos eleitores para o modelo biométrico, eliminando assim o risco de fraudes de identificação pessoal no processo eleitoral. Para o setor público, a biometria oferece mais eficiência, e com isso a redução de custos, o aumento da confiança dos cidadãos nos processos, e claro, aumenta a segurança. O que poucos sabem, é que por trás da tecnologia adotada pelo TSE, está uma empresa brasileira que foi incubada pela Incamp (Incubadora de Empresas da Unicamp), a Griaule.
Na prática, a identificação das pessoas por meio de impressões digitais, face ou mesmo pela íris já faz parte do cotidiano de todos nós. Nossos dados biométricos são as novas chaves para abrir portas, ter acesso à conta bancária, abrir o carro e checar mensagens no celular.
No entanto, apenas cinco empresas em todo o mundo dominam a tecnologia de identificação biométrica de todas as modalidades do Sistema Automatizado de Identificação de Impressões Digitais (AFIS, na sigla em inglês), e desenvolvem as melhores soluções do mundo para identificação biométrica. Uma delas é a Griaule. As tecnologias de reconhecimento criadas pela empresa estão por trás de milhares de transações biométricas feitas diariamente em 74 países.
A empresa, no mercado há 17 anos, surgiu em meados de 2002. “Nos primeiros anos o foco era desenvolver a melhor tecnologia de reconhecimento de impressões digitais do mundo”, conta João Weber, diretor executivo da Griaule. A estratégia deu certo porque, já em 2003, a empresa participou de um campeonato internacional de algoritmos de biometria, conquistando o oitavo lugar entre os melhores algoritmos do mundo. Três anos depois, em 2006, em outra competição internacional, o algoritmo da empresa brasileira teve a menor taxa de erro entre todos os participantes.
No coração da tecnologia da informação
O CEO da Griaule, Iron Daher, idealizou a empresa ao final de década de 1990, quando ainda era estudante de engenharia elétrica da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisava algoritmos para reconhecimento de impressões digitais e faciais. A consolidação aconteceu pouco tempo depois, em 2002, quando o plano de negócios da Griaule foi aceito na Incamp. O principal objetivo de levar a empresa de Goiás para Campinas foi aproximá-la do cluster de tecnologia de informação, que, no Brasil, se encontra fortemente concentrado no Estado de São Paulo, em especial na cidade de Campinas, há pouco menos de 100 quilômetros da capital. Deixar a cidade natal, no entanto, valeu a pena.
Com a infraestrutura e a capacitação tecnológica e gerencial para novos empreendedores oferecidas pela Incamp, ainda no seu primeiro ano de incubação a Griaule iniciou a comercialização do seu primeiro software. Segundo João Weber, a proximidade com uma universidade de primeira linha, como a Unicamp, ainda é fundamental para aperfeiçoar continuamente os sistemas de reconhecimento digital, tanto por conta da atração de talentos, quanto pelas parcerias técnico científicas com os pesquisadores da universidade. A maioria dos profissionais da Griaule estudaram ou ainda estudam na Unicamp e 50% da equipe dedica se à pesquisa e inovação de novos produtos, declarou Weber.
Soluções para mercados exigentes
Estados Unidos, México, Índia, Israel e Colômbia são alguns exemplos de países onde a empresa brasileira tem clientes. Em Israel, a empresa brasileira fornece o software de classificação de padrões biométricos utilizada pela On Track Innovations (OTI), empresa israelense que foi selecionada pelo governo para cuidar da emissão do documento de identidade do país.
Em 2018 a empresa foi destaque na imprensa brasileira especializada em tecnologia por ter vencido uma concorrência para fornecimento de tecnologia de identificação para um projeto do Pentágono que vai aplicá-la no Afeganistão e Iraque. Os produtos da Griaule também estão sendo usados pela polícia estadual do estado do Arizona e pelo Departamento de Controle de Fronteiras norte-americano.
Para os clientes governamentais, a Griaule fornece sistemas de reconhecimento em grande escala, da ordem de milhões de registros, necessários, por exemplo, para controle de fronteiras, emissão de passaportes e de carteira de habilitação, identificação civil e criminal etc. No Brasil um desses clientes é o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O projeto de identificação biométrica da Justiça Eleitoral brasileira, que começou em 2008, tem por objetivo implantar em âmbito nacional a identificação e verificação biométrica da impressão digital para garantir que o eleitor seja único no cadastro eleitoral e que, ao se apresentar para o exercício do voto, seja o mesmo que se habilitou no alistamento eleitoral.
“A introdução do reconhecimento biométrico no TSE tem colaborado para evitar fraudes, como por exemplo, a emissão títulos de eleitor falsos. Desde que iniciamos a parceria, encontramos mais de 30 mil casos de pessoas que tentavam tirar mais de um título de eleitor. Todas as impressões digitais e fotografias de face coletadas são comparadas com o acervo da base de dados para coibir esse tipo de incidente”, explicou Weber.
De acordo com dados do TSE, nas eleições de 2018, estavam aptos a votar 87.363.098 eleitores por meio da identificação biométrica, (59,31% do eleitorado total de 147.306.275) em 2.793 municípios (48,65% do total, de 5.570).
Outra aplicação da identificação biométrica com um importante impacto social, mesmo que em uma escala menor, é a identificação palmar dos recém-nascidos. Obrigatória no Brasil desde 2018, ela previne trocas de bebês nas maternidades, tráfico de crianças, facilita a identificação de crianças abandonadas depois do nascimento. a impressão palmar é coletada logo após o nascimento e é vinculada às digitais da mãe. A Griaule fornece a tecnologia para algumas maternidades no Brasil. Outros clientes brasileiros são a cooperativa de médicos Unimed, com mais de 16 milhões de clientes em todo o país, a Caixa Econômica Federal, a Serasa, Imprensa Oficial, a Polícia Civil do Distrito Federal e a Fundação Casa.
Transformação digital no Brasil
A Griaule está presente no processo de transformação digital em curso no Brasil no qual está incluída a criação do Documento Nacional de Identidade. O DNI vai integrar documentos como o RG, CPF, certidão de nascimento, de casamento e título de eleitor, com validade em todo território nacional. O projeto-piloto foi iniciado em 2018 e aproveita o banco de dados dos eleitores já cadastrados no país – cerca de 90 milhões. Em sua primeira fase o DNI integra CPF e título de eleitor e tem formato digital disponibilizado em um aplicativo gratuito, que pode ser instalado em smartphones, tablets e smartwatches nas plataformas Android e IoS.
O DNI é fruto da interoperabilidade entre bases de dados do Ministério do Planejamento (MP) e do Poder Judiciário. O TSE disponibiliza a base de dados do cadastro eleitoral, que tem a segurança da identificação biométrica do cidadão. O MP provê a plataforma de autenticação digital do cidadão – Brasil Cidadão. A solução vai autenticar o cidadão para uso do aplicativo e servirá para o atendente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) validar o cadastro do cidadão. Somente poderá baixar o aplicativo e ter acesso digital ao DNI quem já fez o cadastramento biométrico (coleta de foto e das impressões digitais) na Justiça Eleitoral. Esse procedimento tem como objetivo reforçar a segurança, a confiabilidade e a rigidez da identificação. “Todo cidadão será checado biometricamente antes de emitir o DNI usando a nossa tecnologia”, finalizou Weber.