Se você já observou uma colmeia de abelhas, deve ter notado que ela funciona graças à coordenação. Cada abelha cumpre um papel em um sistema baseado em comunicação, cooperação e propósito comum. De forma semelhante, a resposta institucional à violência contra as mulheres exige articulação e uma abordagem integral.
Com base nessa premissa, foi realizado em junho o Diálogo Regional de Política 2025 “Violência contra as mulheres: Rumo a uma abordagem integral e coordenada”, organizado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O Diálogo reuniu 85 participantes de 19 países da América Latina e do Caribe para analisar desafios, compartilhar aprendizados e propor estratégias concretas para fortalecer a coordenação institucional.
Um problema multidimensional, estrutural e persistente
Na América Latina e no Caribe, uma em cada quatro mulheres já sofreu violência física ou sexual por parte do parceiro — proporção que aumenta quando se considera a violência cometida por terceiros. A região apresenta taxas de feminicídio de 4,17 a cada 100 mil mulheres, mais que o dobro da média global. Em 2023, foi registrada uma morte violenta por feminicídio aproximadamente a cada duas horas.
A vulnerabilidade é ainda maior entre mulheres com deficiência, afrodescendentes e indígenas, e se agrava em contextos marcados pela presença do crime organizado. O tráfico de pessoas — perpetrado majoritariamente por grupos do crime organizado — afeta desproporcionalmente mulheres e meninas, que representam 62% das vítimas na América do Sul e 82% na América Central e no Caribe.
A violência assume diversas formas — física, sexual, emocional, controle de comportamento — e ocorre dentro de casa, nos espaços públicos, locais de trabalho e ambientes digitais. São situações que se entrelaçam, persistem entre gerações e são sustentadas por normas sociais que as toleram. Seus impactos são amplos: afetam a saúde, a autonomia econômica, o desenvolvimento infantil, a produtividade e a coesão social. Estimativas globais indicam que a violência e o assédio no trabalho geram perdas de até US$ 6 trilhões por ano.
Como construir soluções eficazes
Nenhuma intervenção isolada é suficiente diante dessa realidade. São necessárias estratégias integradas e coordenadas, baseadas em evidências.
Uma abordagem integral articula prevenção, proteção, atenção, acesso à justiça, reparação e reintegração socioeconômica, por meio da oferta de serviços essenciais — saúde, segurança, justiça, educação, apoio psicossocial e financeiro — que sejam culturalmente adequados e considerem os efeitos sobre diferentes grupos de mulheres.
A coordenação multissetorial é fundamental para identificar melhor as necessidades das sobreviventes, oferecer respostas coerentes e evitar sua revitimização ao relatar sua experiência várias vezes. Não se trata apenas de reunir setores, mas de melhorar a qualidade dos serviços, reduzir os custos de acesso e aproveitar sinergias para garantir uma atenção oportuna e eficaz. Apesar dos avanços, ainda há desafios como recursos limitados, escassez de dados, baixa interoperabilidade e capacidades técnicas insuficientes.
É essencial dispor de evidências sobre quais intervenções são eficazes e escaláveis e identificar áreas que requerem mais pesquisa. Uma revisão analítica recente e uma plataforma de evidências oferecem informações sobre o que funciona e o que não funciona para prevenir e para responder à violência contra as mulheres.
Cinco prioridades para os governos da América Latina e do Caribe
Durante o Diálogo Regional, representantes de alto nível de instituições para o avanço das mulheres e dos setores de segurança e de justiça identificaram cinco temas prioritários:
- Modelos eficazes de coordenação: institucionalizar espaços intersetoriais com mandatos claros, governança definida, formação especializada, recursos técnicos sustentáveis e a participação de diversos setores e níveis de governo. Isso inclui mecanismos para o avanço das mulheres, saúde, educação, polícias, ministérios públicos e justiça, com envolvimento da sociedade civil e de organismos internacionais. Exemplos destacados: Ciudad Mujer e Hope and Justice Centres.
- Atualização de marcos normativos e operacionais: melhorar a aplicação de leis, políticas e protocolos; estabelecer ferramentas eficazes de gestão de casos e sistemas de referência e contrarreferência em nível central e territorial para garantir um atendimento oportuno e articulado.
- Sistemas robustos de dados e informação: produzir dados comparáveis e desagregados, melhorar os registros administrativos e as ferramentas de avaliação de risco, promover a interoperabilidade, fortalecer a segurança da informação e as capacidades para análise e uso estratégico em políticas públicas.
- Fortalecimento da prestação de contas: incorporar análises de impacto, avaliações de custo-benefício e indicadores mensuráveis no planejamento e formulação de políticas públicas, com monitoramento e avaliação contínuos.
- Prevenção como estratégia essencial: priorizar intervenções preventivas, especialmente com jovens e homens adultos, e incorporar abordagens que considerem a mobilidade humana e as tecnologias digitais. A Aliança para a Segurança, a Justiça e o Desenvolvimento — integrada por 22 países e 11 aliados estratégicos, com secretaria técnica do BID — promove respostas integrais para mitigar o impacto do crime organizado sobre populações vulneráveis, incluindo mulheres, crianças e adolescentes.
Compromisso coletivo para avançar
Dada a natureza estrutural e multidimensional da violência contra as mulheres, são necessárias respostas coordenadas e sustentáveis. O BID continua apoiando os países da América Latina e do Caribe no fechamento das lacunas de dados, na promoção de sistemas interoperacionais, na melhoria da articulação intersetorial e no fortalecimento das capacidades estatais para enfrentar esse problema como uma prioridade de desenvolvimento.
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