As empresas estatais há tempos ocupam um papel chave entra as ferramentas que contam os governos para promover o desenvolvimento de determinadas indústrias ou proteger interesses nacionais estratégicos. Não obstante, existe grande evidência empírica de que estas instituições podem representar uma fonte de riscos substanciais para seus governos, e que em vários casos estes riscos foram materializados em elevados custos nos orçamentos nacionais.
A origem principal do risco fiscal das empresas estatais (SOE, na sigla em ingês) está relacionada à incapacidade dos governos de se comprometer de maneira confiável a não resgatar empresas estatais caso elas enfrentem sérias dificuldades econômicas. As limitações “suaves” do orçamento (Soft Budget Constraint, ou SBC, na sigla em inglês) afetam negativamente o desempenho das SOE, encorajando-as a aceitar riscos excessivos e inibindo o seu incentivo para ser eficiente.
Uma SBC pode resultar tanto de políticas que afetem, de maneira adversa as finanças das SOE, como de políticas que as favoreçam excessivamente. No el primeiro caso, as políticas de governo podem gerar uma desvantagem competitiva para as SOE em relação a empresas privadas similares. É possível que as SOE esperem um resgate do governo em caso de dificuldades financeiras apesar da ausência de um compromisso explícito e formal de compensação por parte do governo. No segundo caso, os atores de mercado podem facilitar para as SOE acesso a crédito para financiar investimentos inviáveis ou mascarar perdas operacionais prolongadas, na expectativa de que as SOE sejam resgatadas pelo governo no caso de fracasso.
Mitigando e Administrando o Risco Fiscal das Empresas Estatais
Um Documento de Debate recentemente publicado pelo BID analisa as principais fontes de risco financeiro provenientes das SOE e examina as opções normativas para a mitigação e gestão dos riscos resultantes.1
Este estudo diz que um requisito fundamental para uma correta e efetiva governança das SOE é para “nivelar o meio de campo” entre as estatais e as empresas privadas. Isso não significa que não se deva desistir de alinhar as SOE com os objetivos de políticas públicas, mas que esses objetivos deveriam ser claramente identificados e as SOE devem ser compensadas mediante transferências orçamentárias transparentes e mais proporcionais possíveis em relação aos custos que estas empresas terão que incurrir aos perseguir estes objetivos.
As “operações quase-fiscais” que não são compensadas constituem uma das principais fontes de SBC para as SOE. Estas operações incluem: regular preços de bens e serviços oferecidos pelas SOE (especialmente, eletricidade e serviços) a níveis que não permitem recuperar os custos com suficiente eficiência; requisitos que exigem que as SOE aceitem investimentos financeiros inviáveis para extender a cobertura de serviços públicos; executar atividades que não estão ligadas com seu negócio principal; ou utilizar provedores e equipamentos nacionais, mesmo nos casos em que sejam mais caros do que aqueles provenientes do exterior.
Outra fonte potencial de risco fiscal é a excessiva apropriação dos resultados das SOE pelos seus governos. As cargas tributárias ou de prêmios acima daquelas pagas pelas contrapartes privadas ou normas de pagamento de dividendos ditadas por objetivos orçamentários de curto prazo do governo podem resultar na descapitalização das SOE, excessiva alavancagem e/o baixo nível de investimento em infraestrutura essencial, com riscos associados a severas dificuldades financeiras no médio prazo.
Por outro lado, as políticas que favorecem excessivamente as SOE com o tempo também podem dar lugar a significativos riscos fiscais. Isso acontece especialmente no caso de políticas que garantem às SOE acesso preferencial ou incontrolado ao financiamento. Apesar da ausência de garantias explícitas de governo, os mercados financeiros geralmente esperam que os governos socorram as SOE. Este comportamento bem documentado indica a necessidade de supervisão íntima e oportuna (sem ser excessivamente invasiva) do governo sobre as operações das SOE. Infelizmente, tal supervisão se vê incapacitada pela inadequada transparência das operações.
O estudo analisa possíveis recomendações para evitar ou reduzir operações quase fiscais, incluindo, por exemplo, a eliminação de qualquer requisito de conteúdo de investimento ou de aquisição das SOE; e liberação de preços de bens e serviços oferecidos pelas SOE em mercados competitivos; ou estabelecer preços regulados em mercados monopólicos e oligopolísticos em níveis que permitam que as companhias eficientes obtenham lucros adequados.
Entretanto, deve-se reconhecer que com frequência existem obstáculos de economia política e outros para a eliminação de custos quase fiscales sobre las SOE. Dados estos desafíos de economia política e a multiplicidade e variedade das potenciais fontes de SBC das SOE, os governos devem identificar, gerenciar e mitigar os riscos fiscais de acordo com sua situação específica. Não existe uma estratégia que sirva para todos os casos nesta área. Porém, é possível extrair várias e amplas lições sobre as políticas e reformas adequadas das experiências dos diferentes países. A mais importante é que os países devem minimizar a discrição nas relações entre os governos e suas SOE.
Empréstimos para as SOE
O estudo recomenda que os governos instalem controles sobre as SOE prestátarias. Estes controles não deveriam se basear na discrição dos gobiernos, que pode ser influenciada por objetivos políticos de curto prazo, mas em critérios claros, objetivos e pré-acordados, relacionados com a capacidade das SOE de pagar dívidas adicionais.
O documento recomenda especificamente que as permissões de empréstimo do Ministério de Finanças devem ser baseadas em um marco claro e bem publicitado para qualificar as SOE segundo um número de indicadores financeiros, a saber: valor de dívida em relação com ingressos atuais, serviço de dívida, exposição cambial, liquidez, passivos contingentes e rentabilidade. Somente a aquelas SOE que obtenham pontuação mínima em todas estas dimensões poderiam ter permissão de acesso a crédito.
O informe também indica as principais fontes de risco fiscal das SOE em América Latina, que são resultado de alguns tipos de operações quase fiscais não compensadas; altamente discricionais, e em certas ocasiões excessiva extração de recursos das SOE por parte dos governos; o feito de que o critério para a autorização creditícia frequentemente não ser explícito nem aplicado com transparência; e a ausência de análise de risco integrais nos orçamentos das SOE.
Através de estudos de caso, o informe também mostra que alguns países, em particular Chile e Peru, têm mostrando um avanço maior do que outros países da região em termos de melhora da governança fiscal das suas SOE.
Chile, por exemplo, propôs um critério transparente para calcular os subsídios orçamentários para compensar as SOE de transporte urbano por passagens cobradas abaixo de seu custo. Alguns dos principais países (Argentina, Brasil e México), que estavam atrasados com respeito à média da década anterior, aprovaram recentemente ou estão em processo de aprovar, importantes reformas nesta área.
Por exemplo, no Brasil, a nova Lei de 2016 sobre SOE indica que o governo deve compensar financeiramente as empresas se estas são obrigadas a desviar-se de sua missão, como se especifica na lei original que regulamenta a sua criação. No México, recentes reformas no setor elétrico reduziram significativamente o alcance das operações quase fiscais na empresa estatal PEMEX e na Comissão Federal de Eletricidade.
Os resultados até o momento são encorajadores e esperamos que os governos de América Latina considerem nosso estudo útil à medida que avançam com suas reformas.
Leave a Reply