O mercado de Parcerias Público-Privadas (PPPs) no Brasil é extremamente ativo e tem desempenhado um papel relevante na agenda de política pública há décadas. No total, 773 projetos tiveram fechamento financeiro nos últimos 20 anos no Brasil, de acordo com o banco de dados de participação privada em infraestrutura do Banco Mundial. Estes projetos representam um quinto do total de investimentos do setor privado em infraestrutura no mundo em desenvolvimento. O Brasil continuava a liderar as estatísticas no primeiro semestre de 2016, com fechamento financeiro de 27 novos contratos de um total de 108 identificados nos países em desenvolvimento.
Não houve somente um aumento grande na quantidade de PPPs, mas também em sua diversidade. De fato, o país está mudando o seu foco do modelo tradicional de financiamento de infraestrutura econômica financiado pelo usuário e passando a incluir outros tipos de PPPs onde os usuários recebem o serviço ou bem gratuitamente ou de maneira subsidiada, como por exemplo, hospitais, escolas, prisões, iluminação pública, iniciativas de renovação urbana, entre outros.
Como resultado, o número de contratos de PPP com financiamento público pulou para 98 em 2016 de um total de seis em 2006, de acordo com o gráfico abaixo, com uma grande parte desse crescimento ocorrendo a nível subnacional. Estes contratos incluem pagamentos diretos feitos pela autoridade púbica contratante, tipicamente utilizando recursos do orçamento, ao investidor privado durante a vigência do contrato.
Estes contratos têm sido utilizados não somente em setores econômicos tradicionais como transporte e energia, mas também em setores como saúde, educação, instalações esportivas e culturais, gestão de ativos ambientais, entre outros.
O exemplo brasileiro mostra que as PPPs podem ser um instrumento flexível para financiar infraestrutura e também prover soluções para diferentes problemas sociais. Em outras palavras, o uso contínuo das PPPs no Brasil é um exemplo de como o conceito de “Value for Money” (Valor do dinheiro, na tradução ao português) obtido através das PPPs pode ser aplicado para diferentes setores e usuários.
Inovação no uso de PPPs trazem novos desafios
Essa nova onda de contratos trouxe novos desafios a serem resolvidos pelos fazedores de política pública e os profissionais do setor. O maior desafio é manter sob controle os possíveis passivos fiscais desses contratos e comunicá-los de maneira transparente para a sociedade e os investidores.
As PPPs impõem uma carga financeira no orçamento público em diferentes maneiras. A mais óbvia está relacionada às obrigações contratuais explícitas de realização de pagamentos regulares, geralmente estabelecida pela autoridade contratante para subsidiar pagamentos aos usuários ou como a única fonte de receita para a companhia operadora do serviço. Essas são responsabilidades diretas e explícitas, que são tipicamente vigentes durante o contrato. Geralmente podem incluir pagamentos não condicionais, ou seja, pagamentos que deverão ser realizados independentemente das condições operacionais dos serviços sendo entregues.
Com isso, as PPPs geram compromissos de longo prazo por meio de obrigações contratuais que se parecem muito com os contratos de pagamentos de dívida. Precisamente por isso que os padrões de contabilidade internacional determinam que estes compromissos devam estar refletidos no balaço do governo como dívida.
PPPs e passivos contingentes no Brasil
O segundo tipo de passivo gerado pelos projetos de PPPs são os passivos contingentes, ou pagamentos que são incertos e que dependem da ocorrência de eventos futuros. Eles estão associados com esquemas sofisticados de alocação de risco embutidos nos contratos de PPP, geralmente colocados para reduzir a volatilidade do fluxo de receita do investidor privado. Garantias de receita mínimas e de taxa de câmbio e pagamentos adicionais ligados a aumentos de custos específicos são exemplos de passivos contingentes que podem ser criados pelas PPPs. Naturalmente, esses passivos são fonte de risco fiscal que precisam ser reconhecidos devidamente na documentação relacionada ao orçamento e contabilidade pública.
Dados a esses passivos, a sustentabilidade fiscal da política de infraestrutura implementada através das PPPs depende da capacidade dos governos de identificar, o quanto antes possível, as consequências fiscais dos contratos, realizando o seu monitoramento efetivo através do ciclo de projeto, além de administrar os seus impactos e promover uma transparência irrestrita. No contexto brasileiro, há importantes avanços e desafios que precisam ser resolvidos.
O Brasil desenvolveu um arcabouço regulatório detalhado de como as autoridades contratantes devem lidar com o impacto fiscal dos contratos, seguindo a maior parte das melhores práticas internacionais. Esses regulamentos determinam que os governos reconheçam esses compromissos diretos em termos de dívida pública, registrem o risco fiscal no orçamento e no balanço, e divulguem ativamente todas essas informações a cada dois meses.
Governos subnacionais e as PPPs
O desafio é que os governos subnacionais têm sido incapazes de cumprir com esses requerimentos regulatórios. Isso se aplica particularmente a governos subnacionais que são mais ativos no uso de instrumentos de PPPs, mas que encontram dificuldades de criar capacidades para administrar os riscos fiscais.
A maior parte dos governos subnacionais não avalia, mede, monitora ou mitiga os potenciais impactos das PPPs a tempo de tomar decisões adequadas sobre sua acessibilidade. Eles também não comunicam os efeitos totais dos contratos em termos de dívida ou riscos fiscais.
Além disso, há uma limitada imposição do governo central na aplicação dos regulamentos, assim como um limitado monitoramento do impacto agregado a nível nacional desses contratos. Em resumo, vários governos subnacionais estão embarcando agressivamente em esquemas de PPPs em investimentos de infraestrutura social sem apropriadamente avaliar e administrar os potenciais riscos fiscais advindos desses contratos.
A falta de conhecimento para administrar os compromissos do setor público que são chave para vários contratos de PPPs precisa ser resolvida rapidamente pelos formuladores de política e a comunidade de profissionais no Brasil. Para que as PPPs sejam uma solução viável para as necessidades de infraestrutura, o país precisa colocar em prática uma perspectiva de sustentabilidade de longo prazo.
Para apoiar o país neste esforço, o Banco Interamericano de Desenvolvimento publicou um estudo chamado “Os impactos fiscais dos contratos de parceria público-privada: Estudo de caso do ambiente institucional e da prática no Brasil” com recomendações concretas para ajudar o Brasil a resolver os riscos fiscais contidos nos contratos de PPPs.
O estudo se baseia em uma perspectiva internacional comparada e recomenda iniciativas e políticas para impor um arcabouço regulatório, criar capacidades a nível local e promover a transparência em nível de política pública, entre outros. Estas reformas ajudarão ao Brasil assegurar-se de que a PPPs tenham um impacto duradouro e positivo no desenvolvimento social e econômico do país.
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