O potencial das políticas públicas e dos serviços prestados pelo setor público está fortemente relacionado com a qualidade do serviço público. A gestão dos recursos humanos, que envolve aspectos como políticas e práticas de recrutamento, seleção, desenvolvimento profissional, gestão do desempenho e das remunerações, é crucial para atrair, reter e motivar profissionais qualificados.
Realizado a cada dez anos pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Diagnóstico institucional do serviço público federal teve uma nova edição publicada recentemente e apresentada durante o Encontro Nacional de Gestão de Pessoas, realizado pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, com a participação de gestores e profissionais de gestão de pessoas que atuam nos órgãos do Sistema de Pessoal Civil da Administração Pública Federal (Sipec).
A publicação aponta que, entre 2014 e 2024, o país teve avanços em áreas como:
- Planejamento de Recursos Humanos: o nível de formação dos quadros tem avançado, com carreiras de nível superior sendo foco de contratações e diversos cargos de nível fundamental e médio deixando de existir. Houve também melhorias na estruturação e disponibilização de dados e no dimensionamento da força de trabalho;
- Gestão do Desempenho: o novo Programa de Gestão de Desempenho possibilitou a instauração em larga escala de um instrumento capaz de realizar uma avaliação de performance de forma mais fidedigna;
- Gestão do Desenvolvimento: os cursos virtuais da ENAP tiveram um crescimento exponencial, impulsionado pela pandemia. Além disso, foi criada uma nova Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal, que se distanciou da lógica difusa de plano de capacitações e mapeamento de competências que vigorava anteriormente.
- Gestão das Relações Humanas: em 2020, foi realizada a primeira pesquisa de clima organizacional para todo o executivo federal, e o governo está desenvolvendo um novo modelo da avaliação, a ser aplicado de forma perene;
- Capacidade do Sistema de RH: houve um aprimoramento na definição de responsabilidades centrais e setoriais nas diversas áreas de gestão de pessoas.
Essas mudanças levaram a um aumento de 5 pontos no índice de Desenvolvimento do Serviço Público do país, cuja nota consolidada passou de 63 para 68 pontos de um máximo possível de 100 pontos. É o primeiro crescimento no resultado do Brasil, dado que entre 2004 e 2013 o índice ficou praticamente estagnado.
Algumas características comuns associadas a esses avanços, segundo o relatório, são a capacidade de aprendizado, uma estratégia de contorno de limitações legais e a criação de redes de suporte para implementação em larga escala.
A melhoria do país nessas temáticas deve ser também creditada a uma de suas principais qualidades, identificadas já nas outras edições do relatório, que é contar com um serviço público majoritariamente composto por quadros permanentes e selecionados pelo mérito, ou seja, por meio de processos competitivos e transparentes, com menor politização dos cargos.
Do lado dos desafios, o relatório encontra espaços para melhorias, por exemplo, na classificação dos cargos efetivos, na fragmentação salarial de tabelas específicas por carreiras e na seleção para cargos de direção.
Oportunidades e estratégias para contínua modernização do serviço público brasileiro
A criação em 2023 de uma secretária específica para lidar com os temas de gestão de pessoas, desassociados da agenda síndico-salarial, a Secretaria de Gestão de Pessoas (SGP), e de outra dedicada especificamente para o desenvolvimento de propostas de reforma, a Secretaria Extraordinária para a Transformação do Estado (SETE), representam avanços institucionais interessantes para repensar as reformas pendentes, mais complexas, e que requerem um maior consenso.
A contribuição da sociedade civil
Outro ponto de interesse no diagnóstico é o ativo papel que instituições da sociedade civil brasileira vêm adotando em relação a pauta de gestão de pessoas, por exemplo nas agendas de pesquisa de clima organizacional, profissionalização de lideranças e elaboração de estudos diversos para concursos públicos e sistema de carreiras. Tais apoios são um novo componente nesse contexto, representando um potencial para aprofundamento do desenho de soluções nos próximos anos e uma inspiração para outros países.
Gênero e diversidade na administração pública
Esta é a terceira edição da análise feita pelo BID, que utiliza como referência as boas práticas acordadas pelo Brasil e todos os países da América Latina na Carta Ibero-Americana da Função Pública. Mas o levantamento vai além, e aborda temas que não fazem parte da metodologia da Carta Ibero-Americana para fins de pontuação, mas que são bastante relevantes para o cenário do Brasil e da região.
Um desses temas é a questão de género e diversidade na administração pública. Nesse aspecto, são destacados avanços recentes na disponibilidade de informação detalhada e em medidas concretas implementadas para diminuir a sub-representação de mulheres e pessoas negras em cargos de liderança. Por exemplo, foi identificado um aumento de 26% para 33% de mulheres em cargos de alta liderança entre 2019 e 2023. Porém, considerando o percentual de 2023, identificou-se que dentre as mulheres em cargos de liderança apenas 38% possuem filhos com menos de 18 anos, em comparação a 66% dos homens, o que indica a necessidade de abordar desafios mais estruturantes na sociedade.
Em conclusão, depois de 20 anos do primeiro diagnóstico do serviço público brasileiro, o Governo Federal continua sendo um líder regional em gestão de pessoas no setor público. Mesmo com desafios importantes e oportunidades de melhoria – como todos os países do mundo nessa difícil temática – as boas práticas observadas no Brasil continuam sendo uma inspiração para outros países da região e do mundo.
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