Semanas de confinamento (que, em diversas partes do Brasil, ainda são necessárias) fizeram moradores de cidades se lembrar da importância de ter espaços públicos de qualidade. Mas essas áreas, na maioria das cidades do Brasil e dos países vizinhos, são insuficientes: menos de 9 metros quadrados por habitante, de acordo com a Organização Mundial da Saúde.
Falta de planejamento urbano, limitações financeiras ou desigualdade na disposição de parques entre bairros ricos e pobres são alguns dos problemas enfrentados pelas cidades da nossa região – desafios que, em maior ou menor proporção, Nova York superou nos últimos anos.
As estratégias nova-iorquinas
Para elencar os aprendizados decorrentes da maior cidade dos Estados Unidos nesse quesito, lançamos a publicação Parques Urbanos: Nova York. O documento revisa quatro estratégias inovadoras que surgiram na cidade, que hoje conta com mais de 1.700 parques.
Apesar das diferenças de orçamento, escala e contexto entre as cidades latino-americanas e Nova York, acreditamos que alguns exemplos de estratégias e ações tomadas por lá podem inspirar inovações aqui.
Os casos abordados neste documento oferecem vários modelos para planejar, inovar e financiar parques públicos, inclusive por meio de investimento direto do governo e parcerias público-privadas.
Nesse sentido, as estratégias adotadas por Nova York para ampliar sua oferta de parques foram:
1. Parcerias Público-Privadas (PPP): os acordos entre entidades da sociedade civil e o governo equilibram os benefícios das entidades privadas, como agilidade e flexibilidade na intermediação de financiamentos, e os interesses públicos. Também têm a vantagem de existir independentemente da dinâmica política eleitoral, o que permitem planejamentos de longo prazo. Esse arranjo tem sido chave para o desenvolvimento e a manutenção de diversos parques nova-iorquinos. Um dos exemplos mais emblemáticos é o High Line: uma organização formada por moradores do entorno do viaduto ferroviário, a Amigos da High Line, reverteu os planos de demolição e somou esforços para viabilizar o que é hoje um dos parques urbanos mais badalados da cidade.
2. Projetos baseados na Equidade e Orientados por Dados: esses programas tiveram como objetivo atender às necessidades de parques em bairros com menor potencial para gerar fundos provenientes da sociedade civil. Para isso, o poder público conduziu esforços de avaliação de dados, que revelaram menor proporção de investimento por metro quadrado em alguns parques – principalmente aqueles em áreas mais afastadas dos pólos turísticos e financeiros. Também foram avaliados perfil demográfico do entorno desses parques (como pobreza, idade e adensamento). Com esses dados em mão, a prefeitura passou a direcionar investimentos para áreas menos favorecidas, equilibrando as condições dos parques por toda a cidade.
3. Espaços Públicos de Propriedade Privada (POPS): são parques construídos e mantidos pela iniciativa privada, em terrenos privados, mas abertos ao público. Isso se dá por meio de leis que incentivam a reserva de espaços para parques e praças acessíveis ao público em terrenos particulares. Em troca, as construtoras podem ultrapassar certos limites de altura ou de adensamento nas obras. A maioria dos parques nesse modelo estão em distritos comerciais centrais da cidade: Downtown e Midtown Manhattan, onde a iniciativa privada tem interesse em fazer construções mais altas e mais densas, e o poder público ganha com a presença de respiros no espaço urbano.
4. Parques de Resiliência Costeira: aqui, a lição é sobre o potencial dos espaços verdes públicos na prevenção de inundações, em especial em áreas de menor altitude, à beira de rios ou do mar. Em vez de apenas criar estruturas para evitar desastres causados pelas águas, a saída foi investir em design e urbanismo para criar espaços úteis para a vida urbana – os parques. Nesses casos, a maior parte do financiamento veio do poder público.
O documento também apresenta críticas feitas a cada uma dessas estratégias, lembrando que não há solução única para todos os problemas e que a chave está na combinação adequada das fortalezas de cada ferramenta.
O que há por trás dessas quatro estratégias
Além das vantagens e das limitações das quatro estratégias nova-iorquinas, o documento elenca aprendizados — também quatro — que emergem dessas experiências. Os moradores das cidades brasileiras e latino-americanas no geral poderão ter benefícios importantes quando se adaptarem às realidades locais conceitos como:
- Uma mudança na maneira como os parques são vistos: diversos estudos comprovam que os espaços abertos promovem atividades físicas que diminuem obesidade e mortalidade por doenças crônicas; mas não só isso: os parques também contribuem para o funcionamento de outras necessidades urbanas estratégicas, como a segurança, o controle de inundações, a reconstrução de áreas abandonadas e a economia local.
- A necessidade de incluir diferentes grupos de interesse e partes interessadas: poder público ganha ao se articular com iniciativa privada e com moradores em determinadas áreas, e deve ampliar sua atuação em locais menos favorecidos;
- A crescente conscientização da importância da escala no design dos parques: com planejamento adequado e dados, os parques podem ser a espinha dorsal de uma cidade mais resiliente e fortalecer comunidades;
- A importância dos parques como ferramentas para gerenciar os riscos climáticos e ambientais nas cidades: diante da necessidade de reverter a tendência de aquecimento global e de se preparar para diminuir os efeitos das mudanças climáticas, áreas verdes não são apenas desejadas, mas são necessárias.
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