Considerando o cenário de crise econômica global ocasionado pelos impactos sociais da pandemia do novo coronavírus, vislumbrar a possibilidade de retomar o crescimento pode até parecer algo muito distante. Os desafios à cultura empreendedora, que já eram significativos antes da crise, certamente tornaram-se ainda maiores e mitigá-los demandará diversas medidas. Para ajudar a reverter esse quadro, acreditamos que um dos caminhos a trilhar seria o do fortalecimento de iniciativas empreendedoras com a melhoria do ecossistema de startups.
Em nosso novo estudo, Ecossistema de startups no Brasil, fazemos uma análise dos pilares estruturais e dos atores das startups brasileiras e apontamos 10 recomendações para consolidar e expandir essa rede de empreendedorismo. O levantamento revela um retrato das startups entre o final de 2018 e início de 2019, e vale destacar que desde então os números cresceram. Sabemos que um ecossistema de startups dinâmico pode contribuir fortemente para sustentar a inovação, trazer dinamismo e eficiência à produtividade dos setores industriais, facilitar a difusão do conhecimento e gerar maiores oportunidades de empregos de qualidade.
De forma geral, avanços foram registrados em diversos aspectos do ecossistema: desde o acesso a capital e ao mercado externo, até o desenvolvimento de talentos, cultura empreendedora e diversidade. Entretanto, dado seu tamanho e população, o Brasil tem enorme potencial para crescer ainda mais. Em especial, destacamos a necessidade de evolução do ambiente regulatório. A burocracia e a falta de incentivos, agravadas pela ausência de reformas estruturais na economia, atrasam o avanço do setor.
Para se ter uma ideia do potencial de crescimento vamos tomar como exemplo o volume de investimentos, que quase dobrou nos últimos cinco anos. Segundo pesquisa da Anjos do Brasil (2017), o montante de R$ 450 milhões investidos em 2011 passou para R$ 851 milhões em 2016. Embora crescente, o investimento anjo no Brasil está muito abaixo do seu potencial. Para efeito de comparação, enquanto o número absoluto de investidores no país não passa de 10 mil, tendo inclusive diminuído no último levantamento da Anjos do Brasil, nos Estados Unidos há 300 mil investidores, segundo dados de 2016 da Kauffmann Foundation.
Outro aspecto que precisa ser analisado com cuidado é a formação profissional nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM, na sigla em inglês). Com 15% de graduados nessas áreas, o Brasil está abaixo da média mundial (23%), conforme levantamento da OCDE de 2017. Fato é que, desde 2014, o orçamento de ciência e tecnologia vem sofrendo sucessivos cortes no país. Em 2017, o corte foi de 44% em relação ao ano anterior. E, em 2018, houve novo corte de 18%, resultando no menor orçamento nas últimas décadas, correspondente a cerca de um quarto do valor de 2005.
A falta de capacitação adequada soma-se ao número elevado de desempregados registrados no país. Apenas na área de TI, o IDC e CISCO preveem 460 mil vagas não preenchidas na América Latina em 2018, das quais mais de 60% estarão no Brasil.
Melhorias no ambiente regulatório também podem contribuir de forma significativa para o desenvolvimento das startups. A simplificação do ambiente de negócios deve passar por processos ágeis e flexíveis em questões como tributação, legislação trabalhista, abertura e fechamento de empresas e burocracias para acesso a crédito. Nosso estudo revela que, nesses quesitos, o Brasil é um dos piores países do mundo em termos de adequação do seu ambiente regulatório para empreendedores, segundo os principais ranking mundiais.
Nesse sentido, estão em discussão no Congresso Nacional 27 projetos de lei referente às startups e, nos próximos meses, deverá ser lançado o novo Marco Legal de Startups e Empreendedorismo Inovador, que orientará as políticas públicas no sentido de melhorar o ambiente de negócios, facilitar o investimento em startups, bem como tratar de aspectos ligados a relações de trabalho e compras públicas. O maior desafio, porém, é transformar as propostas legislativas em proposições de maior qualidade e relevância para o desenvolvimento do ecossistema.
O Brasil tem um potencial enorme de geração de riqueza, empregos qualificados e soluções tecnológicas de adoção global a partir dos ativos presentes em seu ecossistema de startups. Por isso, listamos abaixo 10 recomendações para aprimorar o ambiente de negócios e promover um desenvolvimento mais acelerado das startups.
- Ações inter-regionais de acesso a mercado: conectar startups e grandes empresas na região latino-americana.
- Apoio na produção de dados específicos e confiáveis: existem poucos dados de qualidade sobre o ambiente de startups no Brasil e na América Latina.
- Apoio a financiamento no “vale da morte”: via aportes de investimento ou co-investimentos com aceleradoras, anjos e fundos de capital semente.
- Apoio a grandes empresas buscando investir em startups: linhas de financiamento e incentivo para grandes empresas criarem e aprimorarem programas de relacionamento e recursos para investimento em startups.
- Suporte à formação de mão de obra qualificada: apoio, fomento e financiamento a iniciativas de formação de profissionais em tecnologia, com especial atenção para a promoção da diversidade.
- Suporte à articulação para modernização regulatória: mediante a produção de conteúdo, eventos de sensibilização e ações de lobby legítimo em parceria com o ecossistema junto ao poder público
- Incentivo ao investimento anjo e aceleradoras: o país tem enorme potencial para o aumento do investimento anjo.
- Estímulo a fundos nacionais para expansão em fases posteriores de crescimento acelerado: se na ponta do investimento anjo e aceleradoras o ecossistema precisa de apoio, no extremo oposto isso também é verdade.
- Influência para uso do poder de compra governamental para inovação: adaptar a estrutura regulatória e os processos de compra do poder público para consumir inovação do ecossistema de startups
- Empoderar os atores do ecossistema: incentivar os atores já existentes no ecossistema, buscando não sobrepor ações ou iniciar do zero projetos que poderiam se alavancar com base em aprendizados de quem já faz essas atividades.
Confira a íntegra do estudo Ecossistema de startups no Brasil para obter mais informações sobre o tema.
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