Torre de monitoramento do AmazonFACE em estação experimental ao norte de Manaus – AM (Phillip Papastefanou)
David M. Lapola*
Embora ainda pouco explorada de maneira sustentável, a floresta Amazônica é, sem sombra de dúvida, um dos bens mais valiosos que a América Latina tem. Superlativos abundam: ocupa uma extensão de 5,5 milhões de km2, armazena em torno de 150 bilhões de toneladas do carbono, abriga de 10 a 15% da biodiversidade do planeta, é responsável pelo aporte de 20% da água doce que adentra os oceanos anualmente, tem uma população de 25 milhões de habitantes, mais de 200 etnias indígenas, e uma ampla uma riqueza sócio-cultural. O potencial latente para desenvolvimento de novos fármacos, cosméticos e produtos de biotecnologia baseados nos recursos genéticos da floresta é imenso.
E como tem passado a floresta?
A grande maioria responderia: “o desmatamento está acabando com a Amazônia”. Desavisados à parte, a verdade é que o desmatamento na Amazônia, sobretudo a brasileira, teve uma queda significativa de 80% desde 2004. Com essa ameaça colocada relativamente sob controle, ganha destaque uma outra ameaça seríssima à floresta e ainda pouco conhecida pelo público em geral e até mesmo pelos cientistas: o efeito que a mudança climática em curso no planeta podem ter sobre o funcionamento da floresta, sobre a biodiversidade que ela abriga e sobre os valiosos serviços ambientais que ela presta para a humanidade (entre eles a regulação do clima regional, provisão de energia hidroelétrica, armazenamento de carbono, etc).
Mudanças climáticas podem acabar com a Amazônia
De maneira alarmante, projeções oriundas de modelos computacionais de clima e vegetação mostram que um aumento de temperatura e redução das chuvas anuais na região poderão ocasionar uma perda catastrófica da biomassa e biodiversidade da floresta Amazônica, fazendo com que a floresta se torne mais parecida com o Cerrado brasileiro. Por outro lado, essas mesmas projeções mostram que o aumento da concentração atmosférica de gás carbônico (CO2, que é a principal causa por trás das mudanças climáticas previstas para as próximas décadas) poderia, em teoria, contrabalancear os efeitos ruins do aumento de temperatura e redução de chuvas aumentando a produtividade da floresta. Esse efeito positivo que o aumento de CO2 pode ter sobre a floresta é chamado de “efeito de fertilização por CO2”. Pouco se sabe se esse efeito realmente ocorrerá na maior floresta tropical do mundo e quanto tempo ele irá durar. É o futuro da Amazônia no fiel da balança!
Ciência e Tecnologia de ponta para o desenvolvimento sustentável
O AmazonFACE, programa de pesquisas apoiado pelo BID, busca identificar esse efeito de fertilização por CO2 e como ele poderia aumentar a resiliência (capacidade da absorver perturbações) da floresta frente às mudanças climáticas. O pilar central do programa é um experimento de campo localizado no coração da floresta em uma estação de pesquisas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), 70km ao norte de Manaus – AM. Neste experimento uma infraestrutura especializada de torres, sensores e tanques submeterá, a partir de 2017, porções da floresta a um nível de CO2 atmosférico 50% maior que o nível atualmente encontrado na atmosfera. Dentro dessas áreas experimentais um time de pesquisadores do Brasil, EUA, Europa e Austrália já vem monitorando os processos ecológicos ocorrendo desde as folhas mais altas das copas das árvores até as raízes abaixo do solo, de modo a caracterizar o ecossistema florestal antes de se elevar o nível de CO2 nessas áreas.
Educação e conhecimento podem ser o fiel da balança!
No período entre 26 de setembro e 1o de outubro deste ano, o AmazonFACE ofereceu, com apoio do BID, a segunda edição do curso de campo “Amazônia e Mudanças Climáticas” voltado para alunos de graduação e pós-graduação, sobretudo do Brasil e América Latina, mas também dos EUA e Europa. O curso, que ocorre na estação experimental mencionada acima, recebe em torno de 20 alunos por ano que têm a oportunidade de aprender em campo como monitorar e até mesmo modelar o funcionamento da floresta Amazônica frente às mudanças climáticas. É uma excelente oportunidade não apenas para a capacitação científica de ponta desses alunos no assunto, mas sobretudo também para conquistar corações e mentes de futuros cientistas para este que é um dos dilemas ambientais mais dramáticos a ser enfrentado pela América Latina na próximas décadas.
*David M. Lapola é professor da Universidade Estadual Paulista – UNESP em Rio Claro – SP. Atua em pesquisas na área de mudanças climáticas e seus impactos sobre os ecossistemas brasileiros. É presidente do comitê científico do programa de pesquisas AmazonFACE – experimento de fertilização por CO2 na floresta Amazônica.
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