Jesus Milagres*
Em um ambiente familiar conflituoso, um atrito verbal mal resolvido pode evoluir para uma ameaça, a ameaça pode se tornar lesão corporal e daí para o homicídio falta pouco. A ruptura desse ciclo pode prevenir episódios dessa natureza no futuro. Mas, como interromper essa escalada de violência?
Foi buscando respostas a essa questão, que a Polícia Militar de Minas Gerais, em Barbacena, criou em 2012 o projeto “Em Prol da Família e da Vida”. Projeto esse que venceu o prêmio Gobernarte 2016, do BID, na categoria “Prevenção e atenção a violência contra as mulheres”.
Para quebrar o paradigma bicentenário de que a polícia comparecia à casa das pessoas apenas para prender alguém ou registrar um delito, a corporação criou o “Cinco Respostas”, um protocolo padrão de atenção às vítimas, assistência familiar e vigilância dos agressores organizado em cinco etapas. Agora, a polícia busca chegar antes do crime, oferecendo opções na resolução de conflitos e promovendo o bem-estar dos cidadãos.
Entenda como funciona o protocolo Cinco Respostas, que envolve a participação de diferentes atores públicos na implementação das seguintes ações:
Primeira Resposta – Acolhimento Diferenciado:
Ao atender um caso de violência em ambiente doméstico, o policial militar deve primar pela condução humanizada da ocorrência, pelo respeito às diferenças, pelo tratamento sem uso de jargões, pelo uso do nome e sobrenome dos envolvidos e dos militares e, em última instância, pela humanização do atendimento policial. Desta forma, houve uma mudança de foco: evoluímos do “atendimento e registro” para o “acolhimento da vítima”.
Segunda Resposta – Visita Familiar:
Cerca de 15 dias depois da Primeira Resposta, a Polícia Militar retorna ao lar assistido, inteirando-se do problema enfrentado e de sua evolução nesse período. A partir dessa fase, entram os parceiros: Poder Judiciário, Ministério Público, Polícia Civil, Assistentes Sociais, Psicólogos, Prefeitura Municipal e sociedade civil organizada.
Por exemplo, casos de uso de drogas e álcool demandam encaminhamento para redes de tratamento. Já a evasão escolar motiva providências por parte do Conselho Tutelar e do Juizado da Infância e da Juventude, dentre outros casos.
Terceira Resposta – Controle à distância
Semanas após a Segunda Resposta, a polícia militar busca preservar a interlocução com a família assistida. O contato acontece por ligações e mensagens em redes sociais. A ideia é dizer para os envolvidos: “Estamos aqui! Precisando, é só falar”.
Quarta Resposta – Visita a vizinhos
Depois de 15 dias da Terceira Resposta, acontece uma visita aos vizinhos da família assistida. Com o cuidado de preservar a intimidade dos familiares envolvidos, o objetivo aqui é verificar se houve novos casos de violência na família monitorada.
Quinta Resposta – Visita final à família
Cerca de dois meses após o ocorrido é feita uma última visita visando conferir se houve solução do conflito identificado. Nessa fase, o ciclo de respostas pode ser encerrado ou a família pode até mesmo retornar à Primeira Resposta, reiniciando o ciclo.
Ao longo desses anos já são quase cinco mil intervenções no ambiente familiar. O projeto já funciona em 19 cidades mineiras. Além da expressiva redução na taxa de homicídios, hoje dois casos por 100 mil habitantes, o principal resultado é a mundança comportamental no relacionamento entre polícia e cidadão, porque “estamos aqui! Precisando, é só falar”.
*Jesus Milagres é coronel da Polícia Militar de Minas Gerais. Atual comandante da 13a Região da PM, com sede em Barbacena/MG. Graduado em Direito e Ciências Militares com ênfase em Defesa Social. É especialista em Segurança Pública e em Gestão Estratégica de Segurança Pública. É associado Pleno do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
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