Arturo D. Alarcon e Renan Orellana*
Até recentemente, a geração de energia elétrica em comunidades e povos isolados da América Latina e Caribe baseava-se principalmente na utilização de combustíveis fósseis. Ainda hoje, é comum encontrar comunidades em ilhas ou na floresta com serviço elétrico disponível em apenas algumas horas por dia apoiado nessas fontes energéticas. Neste post mostraremos como uma combinação de combustíveis fósseis com fontes de energia renováveis pode ser considerada a melhor solução para a geração de energia elétrica nessas comunidades.
O método de geração de energia por combustíveis fósseis apresenta sérios problemas. O principal deles é o custo do combustível que onera o fornecimento da eletricidade. Embora em alguns países existam subsídios estatais para o combustível usado na geração de energia elétrica, reduzindo assim o custo final para o usuário, o custo final para a sociedade é o mesmo – com um subsidio é o estado que suporta os custos, no lugar do usuário. Como, o transporte de combustível representa uma parcela significativa do custo do abastecimento, torna-se um fator limitante, uma vez que na maioria dos casos as comunidades mais necessitadas são remotas e estão distantes das principais rotas de transporte. Mais ainda, esta forma de geração de energia tem um impacto ambiental negativo devido aos gases de efeito estufa e possíveis derrames de combustível e lubrificante durante o transporte e armazenamento.
No caso do Brasil, apesar dos esforços significativos para integrar os sistemas isolados ao Sistema Interligado Nacional (SIN), ainda existem cerca de 250 cidades interioranas com geração isolada nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Roraima, além de uma ilha de Fernando de Noronha. Estes sistemas têm capacidades instaladas que variam entre sistemas pequenos de menos de 1 MW até pouco mais de 20 MW. Em 2015, a energia nos sistemas isolados foi equivalente a 6773 GWh, com 87% de origem térmica, principalmente do petróleo. A conta dos subsídios cruzados para o financiamento dos sistemas isolados no Brasil excede R$ 5 bilhões por ano. Considerando que os sistemas isolados espalham-se em uma região de 3 milhões de km2, o que representa 60% da Amazônia Legal Brasileira, muitos deles apresentam complexidade técnica considerável para atingir sua interligação no SIN.
Como alternativa à geração com combustíveis fósseis, existem sistemas para geração de energia renovável em pequena escala, incluindo energia solar, eólica, hidrelétrica e sistemas de biomassa. Estas tecnologias têm a vantagem de custos operacionais e de manutenção muito baixa. No entanto, em muitos casos, os custos de investimento são maiores do que a geração fóssil; além disso, a maioria das fontes de energia renováveis têm intermitência horária, diária ou variações sazonais na produção, devido às características do recurso.
O que é um sistema híbrido?
Um sistema híbrido é um sistema de geração elétrica que combina numa única instalação várias fontes de energia ligadas a uma rede de distribuição. Com frequência esses sistemas utilizam geração por fontes renováveis e por fontes fósseis, possuem sistemas de controle e podem incluir baterias para acumular a energia produzida.
Quais são as vantagens de um sistema híbrido?
A figura mostra a curva de carga característica de um assentamento rural de um típico país da América Latina ou no Caribe.
A curva mostra três níveis de demanda: uma carga noturna de base (iluminação pública, refrigeração, entre outros), uma carga diária e um pico nas horas da noite de maior atividade (iluminação geral). Em pequenas cidades, um gerador fóssil normalmente cobre apenas o pico noturno e funciona de três a quatro horas por dia. Em cidades maiores, a geração por combustíveis fósseis tem duração média de 16 horas.
Usando a curva exibida no gráfico como exemplo e assumindo um sistema hibrido fóssil-fotovoltaico, a energia renovável pode substituir a geração fóssil durante o dia, reduzindo o uso de combustível e, alternativamente, permitindo estender as horas de alimentação.
Dependendo da potência do sistema fotovoltaico, o mesmo poderia gerar um excesso de energia (pelo meio-dia) que seria armazenada em baterias e poderia mais tarde ser utilizado, reduzindo ainda mais o tempo de funcionamento do gerador que operaria apenas durante a noite ou dias com baixa radiação.
Um sistema híbrido com base em energia renovável não elimina o uso de combustível, mas ajuda a diminui-lo. As baterias também servem para reduzir as interrupções momentâneas próprias da geração renovável. O dimensionamento dos componentes do sistema híbrido visa obter uma combinação óptima entre o tamanho da instalação renovável, as baterias e o gerador com base no combustível fóssil, a fim de minimizar o custo total do fornecimento de energia e maximizar as horas de alimentação.
Em geral o sistema renovável deve ser adaptado a uma instalação de geração fóssil existente; nestes casos, existem complexidades adicionais a considerar, incluindo o estado do gerador fóssil e a necessidade de sistemas de controle que permitam o funcionamento em paralelo com sistemas de energias renováveis, entre outros.
O Brasil é um país com um altíssimo potencial de energia renovável. Os sistemas híbridos são uma alternativa real e rentável para reduzir o uso de combustível de sistemas de geração fósseis nos sistemas isolados, e aumentar o acesso à energia de comunidades isoladas de uma forma mais sustentável.
Qual tem sido sua experiência com sistemas híbridos e como isso afetou sua comunidade? Compartilhe sua experiência com a gente.
*Renan Orellana é engenheiro elétrico pela UMSS-Bolívia e possui mestrado em Engenharia pela USP-Brasil. Com mais de dezoito anos de experiência profissional no setor elétrico. É especializado em energia rural, energias renováveis e uso eficiente da eletricidade. Conta com ampla experiência em pesquisa, desenvolvimento, avaliação, execução, capacitação, docência e direção de projetos de fornecimento de energia. Fruto desta experiência já escreveu mais de cinquenta artigos publicados a nível nacional e internacional e já participou como expositor e instrutor de centenas de eventos. Nos últimos anos, dirigiu projetos importantes de eletricidade rural com energias renováveis na Bolívia. Atualmente trabalha como consultor do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em projetos de Energia Sustentável na Bolívia.
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