Vivemos em um mundo em constante mudança e é fundamental estarmos preparados para enfrentar os desafios da vida contemporânea. O turismo é um setor que vem sendo afetado por diversas crises e desastres ao longo dos anos, de eventos climáticos extremos a crises econômicas e políticas. Nos últimos três anos, a pandemia de Covid-19, incêndios florestais de grandes proporções e conflitos internacionais têm afetado significativamente o setor. Neste contexto, pensar a resiliência associada ao turismo torna-se fundamental. Estar preparado e reduzir os impactos são premissas fundamentais para a gestão dos destinos turísticos, cada vez mais expostos a situações adversas capazes de desestabilizar ou paralisar o setor.
No caso do Brasil, apesar da evidente relevância da resiliência no turismo, foram identificadas lacunas relacionadas com a disponibilidade de informação objetiva e acionável para apoiar a tomada de decisões dos atores públicos e privados. Para contribuir para fechar essas lacunas, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Ministério do Turismo do país elaboraram o caderno didático intitulado “Caminhando para a resiliência do turismo: Gestão de crises e desastres” que apresenta um panorama de como se desenvolveu a gestão de crises e desastres no turismo brasileiro ao longo dos anos e indica os caminhos que podem levar os destinos turísticos a alcançar uma maior resiliência, com recomendações que podem ser aplicadas tanto no Brasil como em outros países da América Latina e do Caribe. Neste blogpost, compartilhamos alguns dos principais temas abordados no caderno.

Crises, desastres e mudanças climáticas
As crises e os desastres geram instabilidade, problemas e impactos negativos de todas as ordens, sendo fundamental gerenciá-los adequadamente para diminuir os danos e, na medida do possível, evitá-los. No entanto, primeiro devemos entender as diferenças entre ambos os conceitos, que geralmente estão relacionadas com a raiz do problema que gerou uma ou outra. Nesse sentido, há um certo consenso que estabelece que quando a causa é um evento interno, como a falta de capacidade de gestão ou falha na adaptação a uma mudança, falamos de uma crise; quando a causa é algo sobre o qual não temos controle e está relacionada com aspectos externos, falamos de um desastre[1]. Diferentes tipologias de crises e desastres podem afetar o setor do turismo, incluindo tanto no destinos como organizações. Com base na abordagem de Ritchie (2009)[2], identificam-se as seguintes categorias:
• Desastres físicos ou naturais, biológicos e tecnológicos, como a pandemia de Covid-19.
• Crises e desastres políticos, como a guerra entre a Rússia e a Ucrânia em 2022.
• Crises econômicas, como a crise mundial de 2008.
• Confrontos internos, violência e insegurança, como sequestros de turistas e roubos.
• Megadanos, como o acidente nuclear na usina de Fukushima em 2011.
Ao falar de crises e desastres, é essencial também abordar as mudanças climáticas. Estas consistem em alterações a longo prazo nas temperaturas e padrões climáticos que podem ser naturais ou atribuídas direta ou indiretamente à atividade humana e geram uma série de impactos sociais, culturais, ambientais e econômicos, incluindo várias crises e desastres. O setor do turismo, por um lado, contribui para as mudanças climáticas (por meio das emissões relacionadas com o transporte, por exemplo), mas ao mesmo tempo é altamente vulnerável a essas mudanças, como ao aumento da incidência de fenômenos climáticos extremos e ao aumento do nível dos oceanos, entre outros.
A resiliência refere-se à capacidade de um sistema para se adaptar e recuperar de situações adversas. Cada vez mais se evidencia a necessidade de abordar de forma integral no setor do turismo tanto as medidas focadas nas mudanças climáticas, como as medidas concebidas para prevenir as crises e os desastres, em busca dessa maior resiliência. No turismo, isso significa ser capaz de enfrentar e superar crises e desastres, minimizando seus impactos e fortalecendo o setor. Desta forma, os destinos e as empresas turísticas poderão recuperar-se mais rapidamente das crises e desastres, mantendo sua competitividade e sustentabilidade no longo prazo.
Prevenir, planejar e aprender
Para promover a resiliência, pode-se elaborar um Plano de Gestão de Crises e Desastres no Turismo, que pode ter foco num destino, empresa ou organização. Algumas das características comuns que são relevantes na elaboração desses planos são:
• Matriz de responsabilidades compartilhadas: As crises e desastres que afetam o turismo podem afetar também outros setores, a população, as infraestruturas e os territórios em geral. Por isso, é imprescindível que vários atores-chave se envolvam no processo de planejamento e gestão das crises. Uma prática comum observada em nível mundial é a criação de comitês ou conselhos específicos, na sua maioria intergovernamentais e intersetoriais.
• Prontidão para situações de crise e desastre: É importante “estar pronto”, o que implica a existência de planos, mas também a realização de exercícios de resposta a crises e desastres, a capacitação das equipes e profissionais que atuam nos destinos e o estabelecimento de fluxos de coleta e transmissão massiva de informações e alertas.
• Identificação dos riscos: Implica mapear e avaliar potenciais situações que podem surgir, bem como a probabilidade relativa de ocorrência e que se tornem crises ou desastres. É o ponto de partida nos modelos e sistemas de gestão de crises e desastres. Pode incluir informação territorial específica relacionada com os riscos e identificar os seus impactos em grupos específicos (como turistas, por exemplo).
• Mitigação dos riscos: Com base no mapeamento de riscos, devem ser estabelecidas medidas específicas para minimizar os danos, consequências e impactos esperados para os diferentes atores-chave identificados. A seleção de medidas deve considerar, entre outros, a disponibilidade de recursos, capacidades locais e conduzir-se de maneira participativa. Medidas de mitigação de riscos de crises e desastres no setor podem incluir estruturas de apoio à evacuação, transmissão de alertas, recomendações de suspensão de viagens, etc.
• Formulação de respostas rápidas: São aquelas dedicadas às consequências imediatas de um evento, a serem implementadas numa fase ainda caótica. Inicialmente de caráter operacional, estão centradas no controle de danos à vida humana e à propriedade/infraestrutura. Podem incluir o acionamento dos comitês internos de gestão de crises e desastres, coleta e compartilhamento de informações sobre a situação e o monitoramento de sua evolução.
• Estabelecimento de mínimos para a fase de recuperação e retomada: Centrada em restabelecer o funcionamento do destino e/ou das organizações com segurança e com a qualidade mínima exigida. Inclui o apoio à continuidade das operações de serviços turísticos, recuperação de infraestruturas danificadas, comunicação, e implementação de estratégias de marketing.
O caderno didático completo em que se baseou esse artigo inclui ferramentas, instrumentos e exemplos que podem orientar a definição de planos, medidas e ações dirigidas a melhorar o processo de gestão de crises e desastres no setor, não apenas no Brasil, mas em outros destinos da América Latina e do Caribe. A publicação está disponível em português e espanhol.
[1] Brent, Ritchie, Yawei Jiang (2019). A review of research on tourism risk, crisis and disaster management: Launching the annals of tourism research curated collection on tourism risk, crisis and disaster management, Annals of Tourism Research, Volume 79.
[2] Ritchie, B. W. (2009). Crisis and Disaster Management for Tourism. Channel View Publications.
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Video: O Grupo BID, trabalhando para promover o turismo sustentável na América Latina e no Caribe
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