Este é o primeiro post da série que entrevistará empreendedores sociais em diferentes áreas
O setor de tecnologia está se desenvolvendo em uma velocidade sem precedentes e gerando profundas transformações a nível global. Tecnologias como blockchain, inteligência artificial, aprendizagem de máquina, análise de dados, internet das coisas e robótica estão trazendo inovação para as indústrias do “mundo real”.
Como falamos no artigo “Por que inovação aberta para o desenvolvimento”, o Brasil vem liderando o desenvolvimento dessas tecnologias na América Latina e representa 30% de todo o ecossistema da região. Ainda assim, a maior parte do setor público tem se beneficiado muito pouco dessas soluções, mesmo com as inúmeras necessidades que possuem, especialmente tecnológicas, para fazer chegar os serviços aos cidadãos de uma maneira melhor e mais custo-efetiva.
No Brasil, o gestor público interessado em comprar inovação possui dois grandes entraves: falta de mecanismos de aquisições públicas eficientes e falta de segurança jurídica para compra de inovação. Por outro lado, poucos empreendedores, detentores de tecnologias da 4a revolução industrial, estão interessados em vender para o setor público. O setor privado ainda é mais atraente pela facilidade da compra e menor burocracia.
Programas como Pitch Gov, Pitch Sabesp e BrazilLab fomentam pilotos de startups e scale ups no setor público, mas ainda encontram desafios na efetivação da compra da inovação desenvolvida. A sociedade civil muitas vezes financia a adoção de tecnologia pelo setor público, focando no aumento de impacto das políticas públicas no país. Para o BID, nosso papel fundamental é facilitar a compra de inovação utilizando os mecanismos de aquisições próprios do Banco; fomentar a cultura de custo-eficiência via inovação, e apoiar a adesão a legislações mais adequadas, como o Marco Legal de Inovação.
Em meio a essas dificuldades, alguns empreendedores se tornaram os “first movers” e estão investindo na mudança de cultura da gestão pública e desenvolvendo ferramentas disruptivas para o setor. Para fomentar ainda mais esse debate, entrevistamos Rodolfo Fiori que é co-fundador e diretor de relações institucionais da GOVE, uma startup focada em aumentar a eficiência fiscal da administração municipal através de plataforma Software as a Service.
Como foi o momento em que você e seus sócios decidiram abrir a Gove?
RF: Eu estava tentando ajudar a minha cidade, São Joaquim da Barra/SP, e descobri que o problema era muito maior do que eu imaginava. O Estado e a União não possuem estrutura para apoiar o município com soluções personalizadas, as consultorias têm preços muito altos e consultores locais, em sua maioria, não garantem qualidade e resultado de suas iniciativas. Percebi que os municípios tinham um problema gigante e que não existia uma solução de qualidade e com preço competitivo no mercado.
Por que decidiram investir no setor público? Qual foi a grande motivação?
RF: Não foi um processo linear. Sempre tive a vontade de ser empreendedor e achei uma oportunidade relevante de impacto positivo na sociedade e de negócio no setor público. A certeza de gerar um impacto na sociedade foi um diferencial na minha decisão sobre qual tipo de negócio iria me engajar.
Quais são os principais desafios que vocês estão enfrentando e como estão os superando?
RF: O principal desafio é vender para o governo. Para contratar uma solução, o gestor público precisa entender o que a solução faz e para qual problema ela é adequada. Muitos municípios têm dificuldade em entender o que é uma plataforma Software as a Service. Já demos alguns passos no sentido de sanar este problema, uma vez que alguns municípios já conseguiram construir editais e iniciar o processo licitatório.
Estes documentos são públicos e outros municípios podem acessá-los, fazendo assim com que novos municípios que queiram nos contratar tenham um material de referência para consultar. Ainda no tema de vendas, uma outra dificuldade é a formação de preço para soluções inovadoras dado que, pelo menos de nosso conhecimento, não temos concorrentes com soluções similares às da GOVE. O desafio é que a maioria dos municípios não inicia o processo de compras se não conseguem cotar com outros fornecedores. Por último, um desafio importante de mencionar é o de desenvolvimento de tecnologia, que ainda é muito caro no Brasil, dada a mão de obra escassa.
Quais foram as principais vitórias até agora?
RF: Estamos bem animados por termos conseguido romper a barreira dos primeiros editais e estar gerando tanto impacto. A gente garante o retorno ao município de três vezes o valor investido na nossa solução. Em época de restrição fiscal, estamos conseguindo mudar a realidade de algumas cidades. Outra coisa que nos orgulha muito é que mesmo com todas as dificuldades de vendas e tecnologia, estamos conseguindo construir uma empresa que prioriza a diversidade e um ambiente de trabalho extremamente saudável que coloca ética acima de tudo.
Qual é o grande sonho de vocês?
RF: A gente quer realmente construir uma solução escalável, que possa ser vista no futuro como uma política pública de construção de capacidade institucional na gestão municipal. Nosso modelo federativo exige que alguém apoie a ponta e queremos nos tornar esse mecanismo.
Como você acha que os órgãos de controle podem se preparar para fiscalizar a compra de inovação?
RF: Acredito ser importante buscarmos melhorar o entendimento em relação aos novos tipos de soluções existentes no mercado. O perfil das soluções mudou, e isso reflete no que foi pensado lá atrás, nas leis que regem os processos de compras de administrações públicas. Os quadros dos Tribunais de Contas são ótimos, eles conseguem olhar de forma crítica e apoiar o gestor público na estruturação de um melhor caminho para contratação de inovação. Os órgãos de controle poderiam também capacitar o mercado privado, que quer oferecer a melhor solução ao setor público, mas muitas vezes não sabe como.
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